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Movimento antifascista ganha força nas ruas e nas redes sociais

O professor de História Felipe Cazetta analisou, no programa Conexões, as características do fascismo e como elas são apropriadas por governos no século 21

Manifestante carrega bandeira antifascista durante ato em São Paulo
Manifestante carrega bandeira antifascista durante ato em São Paulo Pam Santos / Fotos Públicas / CC BY-NC 2.0

Contra o racismo e em defesa da democracia, neste domingo, 07, diversas manifestações tomaram as ruas pelo Brasil, em pelo menos 13 capitais. Já é o segundo fim de semana de protestos de movimentos antifascistas, que começaram no fim de maio, puxado por coletivos originários de torcidas de futebol. Em Belo Horizonte, um grupos de profissionais da saúde também foi às ruas em defesa da democracia e em repúdio a negligência do presidente Jair Bolsonaro em relação a pandemia de Covid-19. Além das ruas, o movimento antifascista ganhou as redes sociais: perfis de personalidades públicas e anônimas estão escrevendo e se posicionando em relação ao fascismo e ao racismo, engrossando um movimento internacional. As buscas pela palavra “fascismo” cresceram 1.126% no Google, nesta semana, e a busca pelo termo “antifascismo” subiu também, mais de 5.000%.

Porque, em pelo século 21, ainda lutamos contra o fascismo? O professor de história, Universidade Estadual de Montes Claros, Felipe Cazetta, discutiu o assunto no programa Conexões, da Rádio UFMG Educativa. Durante a conversa o professor explicou que historicamente, o fascismo é considerado um fenômeno irrepetível. “O fascismo é um fenômeno da primeira metade do século 20, que teve origem em 1919, na Itália, em resposta a um contexto de crise e instabilidade da burguesia. Ele também se manifestou na Alemanha, em 1933, com Adolf Hitler, potencializado pela crise de 1929”, contextualizou o professor. Porém, para Cazetta, isso não impede que sejam traçados paralelos entre os movimentos fascistas e as atitudes de outros governos na atualidade. Segundo o professor, o que observamos é “uma apropriação dessa ideologia, e acomodação do fascismo em um novo contexto.”

De acordo com o professor, “o que foi observado historicamente é que o movimento fascista pode não ter um cerne ideológico radical, e para ascender ao poder, ele realiza negociações com elites dirigentes, o que o torna ainda mais plástico e acentua o seu pragmatismo”. Por isso, para Cazetta, é difícil definir um conceito fechado de fascismo. “De modo geral, o que observamos historicamente é que o fascismo ascende em momentos de crise política, institucional e econômica, potencializado pelo receio da burguesia de perder a sua hegemonia para classes subalternas em ascensão”, explica. O professor pontua, portanto, que “entendendo as instabilidades institucionais, sociais e econômicas, é possível, entendermos a ascensão de um fascismo remodelado no século 21”.

O professor Felipe Cazetta pontua que, em muitos países, é possível perceber a ascensão de lideranças de extrema direita a partir de mecanismos democráticos, que depois de eleitas, passam a minar o Estado institucional. Em relação à situação do Brasil, Cazetta defende que requer uma análise muito complexa. “Existem vários projetos dentro do governo Bolsonaro, que travam disputas entre si, por isso não dá para determinar se existe um programa fascista”, defende o professor. Porém, Cazetta não deixa de apontar que percebe aflorar alguns elementos do fascismo no governo Bolsonaro: “Em seus discursos, o presidente constantemente faz o exercício de vincular o destino da nação à própria experiência do líder; trava guerras híbridas de informações e apresenta uma necessidade recorrente de apontar aquele que pensa diferente como ‘o inimigo’. Recentemente, realizou uma manobra de informações, que retira a segurança dos dados oficiais. Todas essas são características de um ‘proto-fascismo’”, exemplifica o professor. 

As manifestações antifascistas, realizadas no país nos últimos fins de semana, são analisadas como legítimas pelo professor, que aponta a importância das torcidas organizadas na articulação desses movimentos. “É positivo ver o aflorar de uma postura política ativa, principalmente das torcidas organizadas, que já tem uma estrutura de comando e coesão na cidade”, analisa o professor. Porém, lhe preocupa o momento em que esses levantes estão ocorrendo “É triste que isso esteja acontecendo enquanto enfrentamos uma pandemia, num momento delicado da história mundial, porque essas aglomerações inevitavelmente vão levar à uma saturação no sistema de saúde”, pondera o professor Felipe Cazetta.

Esquerda ou direita?
Durante entrevista para o Programa Conexões, o professor Felipe Cazetta respondeu a um questionamento que tem se tornado cada vez mais comum: o movimento fascista era de esquerda ou direita? Cazetta elucidou que “o movimento tem suas origens na extrema direita, mas o que ocorre é uma confusão intencional, por parte dos líderes do movimento, que utilizam símbolos e nomenclaturas relacionadas à esquerda como forma de provocação ao proletariado”. O professor traz o exemplo da própria bandeira do nazismo: “No livro ‘Minha Luta’, Hitler afirma que a utilização da cor vermelha é uma forma de afrontar os operários”.

“Posterior à consolidação do fascismo no poder, o terror é muito pouco seletivo. Os adeptos ao fascismo hoje, podem dividir um campo de concentração amanhã com os indivíduos que eram tidos como o mal. É importante ter isso em mente e tratar com carinho a democracia, que é o espaço do debate. Fascismo é o fechamento de qualquer alternativa”, advertiu o professor Felipe Cazetta, durante a entrevista desta segunda-feira, 08.

Ouça a conversa com Luíza Glória

Produção de Arthur Bugre