Mulheres e jovens sofrem mais com os efeitos da pandemia e do isolamento social
Alterações na rotina e no estado de ânimo dos brasileiros foram verificadas no estudo nacional ConVid - Pesquisa de Comportamentos
Durante a pandemia da Covid-19, quais foram as mudanças nas rotinas dos brasileiros? E nas situações de trabalho? Houve alterações no hábito de fumar e no consumo de bebidas alcoólicas? Quais os efeitos da pandemia na saúde e no estado de ânimo? Essas foram algumas das perguntas feitas por um estudo chamado “ConVid - Pesquisa de Comportamentos”, que buscou verificar como a pandemia afetou a vida da população brasileira. O estudo foi coordenado por três instituições: Fundação Oswaldo Cruz, Universidade Estadual de Campinas e UFMG.
A pesquisa foi realizada de maneira virtual, e obteve respostas de 44 mil e 62 brasileiros adultos. Essa amostra foi calibrada por meio de dados do IBGE para que fosse obtida a mesma distribuição por unidade da federação, sexo, faixa etária, raça ou cor, e grau de escolaridade. Os resultados podem ser analisados por diferentes perspectivas, mas a professora da Escola de Enfermagem da UFMG, Deborah Carvalho Malta, uma das coordenadoras da pesquisa, adverte que, de maneira geral, as respostas apontam para uma dificuldade do brasileiro em lidar com o novo cotidiano. “O que se observa em uma grande parcela da população é uma sobrecarga com aumento das tarefas. O trabalho em casa e o acúmulo de tarefas domésticas se somam aos medos relativos à doença e ao adoecimento da família. São experiências de estresse que têm afetado de forma expressiva a vida, o cotidiano e até a saúde dos brasileiros”, explica a professora.
As alterações constatadas no estudo refletem na saúde mental e física da população. A pesquisa mostrou que metade das pessoas que já tinham problemas crônicos de coluna, sofreram com o aumento da dor. No grupo que não tinha esses problemas, 40% disseram que passaram a ter dores na coluna por causa das mudanças nas atividades habituais. O sedentarismo também aumentou, o que pode ser parte desse problema, segundo a professora Deborah Carvalho Malta. De acordo com os dados dessa pesquisa, apenas 13% dos brasileiros conseguiu se manter praticando atividades físicas com regularidade durante o período de isolamento social, em comparação com os 30% dos brasileiros que mantinham essa prática antes do período de afastamento.
Outra preocupação relacionada à saúde diz respeito aos hábitos de consumo dos brasileiros. A pesquisa revelou que entre os fumantes, quase 23% aumentaram em cerca de 10 cigarros o consumo diário. No caso da ingestão de bebidas alcoólicas, 18% da população disseram que passaram a beber mais. De acordo com Malta, será necessário um longo trabalho em relação à redução do consumo desse tipo de substância: “Todos esses dados devem ser olhados com muita atenção tanto pelo setor público, quanto pelo privado. Com o retorno das atividades, após o isolamento social, os serviços de saúde deverão estar mais atentos para medidas de prevenção e redução relativas aos novos hábitos de consumo de tabaco e álcool. Ações para a promoção de atividades física e da alimentação saudável, que caíram muito neste período, também serão necessárias”.
Mulheres e jovens sofrem mais
Os efeitos da pandemia no estado de ânimo da população foram um ponto central de análise da pesquisa ConVid. De acordo com os dados obtidos, os jovens e as pessoas do sexo feminino foram os grupos que mais relataram piora na saúde mental. Entre os entrevistados com 18 a 29 anos de idade, 70% disseram ter sentido ansiedade ou nervosismo muitas vezes ou sempre durante a pandemia. Fazendo a divisão por gênero, foi possível reparar que 50% das mulheres disseram ter se sentido tristes ou deprimidas frequentemente durante o período de isolamento social. A taxa cai para 30% entre os homens.
A professora Deborah Malta, em entrevista à Rádio UFMG Educativa, avalia as possíveis causas desses resultados: “Muitas mulheres estão sobrecarregadas, trabalhando em home office, cuidando da casa e dos filhos, por conta de uma cultura machista que define as tarefas domésticas como sendo do campo feminino. A pandemia não mudou isso, e inclusive exacerba essa questão”, afirma a professora. No que diz respeito aos sentimentos relatados pelos jovens, Malta analisa: “As pessoas dessa faixa etária deixaram de participar de atividades de lazer, encontros sociais, e estão sendo forçados a praticar um estilo de vida recluso, que muitos não experimentavam antes”.
Em entrevista ao programa Conexões, a professora da Escola de Enfermagem da UFMG, Deborah Carvalho Malta, ainda revelou a intenção de realizar uma pesquisa futura com os adolescentes, visando analisar os efeitos da pandemia e das aulas online nessa faixa etária da população.
Os resultados completos, com todos os dados levantados pelo estudo, estão publicados no site da Fiocruz. O estudo foi coordenado pela Fundação Oswaldo Cruz, pela Universidade Estadual de Campinas e pela UFMG, e também teve pesquisadores de outras três instituições: Universidade de São Paulo, Universidade Federal de Sergipe e Universidade Federal de Ouro Preto.