Arte e Cultura

Novembro Negro é aberto em Montes Claros com show de tambores, roda de conversa e oficina de grafite

Representantes de coletivo de estudantes e de quilombos da região falaram de suas vivências, desafios e conquistas

Apresentação do Yorubloco durante a abertura do Novembro Negro em Montes Claros
Apresentação do Yorubloco durante a abertura do Novembro Negro em Montes Claros Foto: Ana Cláudia Mendes | Cedecom Montes Claros

O som dos tambores do Yorubloco anunciou o início das atividades do Novembro Negro no campus regional Montes Claros. Na noite de terça-feira, dia 12, o grupo fez uma apresentação em homenagem aos orixás com cantos e danças africanas no gramado central. Acadêmicos, docentes e quilombolas do Norte de Minas acompanharam tudo e até se juntaram aos artistas na execução de alguns passos.

Após a apresentação, foi realizada a abertura da roda de conversa com a participação da pró-reitora de Assuntos Estudantis, professora Licínia Maria Correa, do vice-diretor do campus regional Montes Claros, professor Alcinei Místico Azevedo, do psicólogo da Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump) em Montes Claros, Sidney  de Souza Junior, e da estudante de Zootecnia Josilene Lima, que representava o Coletivo dos Estudantes Indígenas e Quilombolas (Coleiq) do campus Montes Claros. O vice-diretor destacou a importância do evento e da participação da comunidade acadêmica. “Nós assistimos a um espetáculo maravilhoso. Agora, temos uma roda de conversa. É uma oportunidade de dialogar e aprender bastante”, destacou Alcinei Místico.

Licínia:
Licínia: esforço de construção de uma agenda únicaFoto: Ana Cláudia Mendes | Cedecom Montes Claros

Lugar no calendário acadêmico
A pró-reitora de Assuntos Estudantis, Licínia Correa, apresentou um breve histórico do Novembro Negro da UFMG, iniciado em 2018, e falou da participação do campus regional Montes Claros na iniciativa. “O Instituto de Ciências Agrárias tem sido um grande parceiro do evento. Temos aqui o Coletivo dos Estudantes Indígenas e Quilombolas e servidores técnico-administrativos e docentes muito empenhados. Há um número muito grande de pessoas e grupos que colaboram com a organização”, pontuou ela, que anunciou que o Novembro Negro já está incorporado ao calendário acadêmico da UFMG. “Depois de sete anos de história, conquistamos na Universidade o nosso lugar no calendário acadêmico. Há sete anos, temos grupos construindo o novembro como o mês da consciência Negra. Um momento importante em que a gente reflete sobre temas como racismo, inclusão e pertencimento à Universidade. Temos buscado construir uma agenda única com o objetivo de promover o senso de pertencimento à Universidade".

Josilene Lima, do Coletivo dos Estudantes Indígenas e Quilombolas do campus regional Montes Claros, falou sobre o papel do grupo. “Ele surgiu para fortalecer e dar visibilidade à presença de povos originários e dos povos das comunidades quilombolas no campus e em outras universidades e instituições de ensino público e gratuito. Povos que muitas vezes são invisibilizados socialmente e enfrentam preconceitos e estereótipos”, disse a estudante.

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Noêmia, do Quilombo Nogueira: preservar os costumes dos antepassados Foto: Ana Cláudia Mendes | Cedecom Montes Claros

Vivências nos quilombos
Representantes de quilombos da região se juntaram ao grupo para participar da roda de conversa. Noêmia Nogueira, mãe de Vanessa Nogueira, presidente do Quilombo dos Nogueira, de Montes Claros, Dermira Ferreira, representante do Quilombo Lapinha, de Matias Cardoso, e Milene Cristina Oliveira, estudante do campus regional Montes Claros, negra e deficiente auditiva, falaram de suas histórias e vivências. 

O Quilombo dos Nogueira é o primeiro quilombo urbano do Norte de Minas. Ele fica no bairro Camilo Prates e abriga cerca de 60 pessoas (14 famílias). O reconhecimento do lugar como Quilombo foi formalizado pela Fundação Zumbi dos Palmares em 2017. Noêmia Nogueira relatou que, no local, procura-se preservar os costumes dos antepassados. “Sempre moramos onde hoje é o quilombo. Era uma região de fazendas. Hoje, são bairros. Mas nós não vendemos nem loteamos o terreno. Lá, temos mata fechada e lagoa.”, disse Noêmia. 

Dermira Ferreira, representante do Quilombo Lapinha, de Matias Cardoso, falou da vida no local e do reconhecimento como quilombo. Segundo ela, somente famílias de quilombolas moram na área e todos têm que seguir determinadas regras de convívio. Para ela, o acesso de quilombolas ao ensino superior é um grande avanço. “Com o reconhecimento, o quilombo passou a ser inserido nas instituições. É muito gratificante ver um irmão nosso, do quilombo, na UFMG. É por meio dele que o conhecimento vai chegar até nós", proclamou.

Inclusão
Milene Cristina Oliveira, estudante do segundo período do curso de Zootecnia, acompanhou todo o evento assistida por uma intérprete de Libras. Durante a mesa-redonda, ela falou de sua trajetória como mulher negra e surda e de sua experiência na UFMG. “Quando percebi que era a primeira pessoa surda, que usa a língua brasileira de sinais, que vinha para o campus, eu senti muito medo e insegurança”. 

Os desafios foram sendo vencidos aos poucos, relatou. Além da intérprete de libras, Milene viu que podia contar também com outras pessoas na Universidade. “Eu comecei a perceber que as pessoas ouvintes, os meus amigos e outras pessoas, que eu nem conhecia e com quem não conseguia me comunicar em um primeiro momento, hoje se comunicam comigo”, relatou. A estudante discorreu ainda sobre os desafios para a pessoa surda: “Para nós é diferente, porque usamos outra língua: a brasileira de sinais (Libras). E vocês, ouvintes, usam a língua portuguesa. Eu uso o português, mas é difícil. Agradeço muito a vocês por todo o apoio”.

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Wender Miranda e alunos preparam parede da Moradia Universitária Cyro Versiani dos Anjos para receber grafiteFoto: Ana Cláudia Mendes | Cedecom UFMG

Grafite
A programação do Novembro Negro teve continuidade nesta quarta-feira, dia 13, com uma oficina de grafite na Moradia Universitária Cyro Versiani dos Anjos. O monitor e grafiteiro Wender Miranda introduziu a atividade com uma contextualização histórica do movimento hip hop até chegar ao grafite como movimento de rua. “O grafite convive no mesmo cenário que a pichação. Porém, a pichação é um ataque ao sistema, caracterizado por linguagem interna entre os grupos. O grafite vem da pichação, ele continua acontecendo na via, mas de modo que aquelas mesmas letras da pichação ganharam mais forma e mais cor. Ele é feito na rua, é mais solto”, disse. 

Os alunos aprenderam técnicas de desenho e começaram, em conjunto, a desenhar um grafite na parede da moradia. A imagem deve ser concluída nos próximos dias. 

Ana Cláudia Mendes | Cedecom Montes Claros