Institucional

Peter Burke defende resgate dos generalistas do conhecimento

Em conferência, historiador afirmou que a figura do polímato perdeu espaço com o avanço da especialização

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Peter Burke abordou as 'crises do conhecimento'
Lucas Braga / UFMG

Em conferência do ciclo UFMG, 90: desafios contemporâneos, que integra as comemorações dos 90 anos da universidade, o historiador Peter Burke abordou, na manhã desta terça-feira, dia 21, a evolução dos polímatos, intelectuais que têm domínio sobre diversas áreas do conhecimento e que, segundo ele, estão desaparecendo.

Em sua exposição, Burke destacou que três crises mudaram a relação das pessoas com o conhecimento.  A primeira ocorreu na Europa, no século 17, e foi provocada pelo surgimento dos livros impressos. A segunda, no século 19, deveu-se à proliferação de livros no ocidente. Já a terceira crise, que se dá em escala global nos dias atuais, surge em decorrência do excesso de informação, potencializado, principalmente, pela internet e pelas novas tecnologias.

Para o historiador, todas essas mudanças estão relacionadas aos avanços nas tecnologias de comunicação. “Antigamente, os estudiosos dominavam várias áreas, e isso era visto como algo normal. Trata-se dos polímatos, estudiosos que se interessavam por diversas disciplinas. Quando o conhecimento começou a ser mais especializado, os polímatos começaram a perder espaço”, explicou.

O pesquisador citou polímatos que foram responsáveis por descobertas importantes para a sociedade. Eram considerados gigantes intelectuais e “monstros da erudição”. “Isaac Newton foi um bom exemplo de polímato, visto que suas contribuições para o campo da ciência não se limitavam à física. Ele também se interessava pela alquimia e pela teologia. Estudiosos como ele alcançaram grandes descobertas, transitando por áreas diversas como a música, a matemática e a linguística.”

Para o pesquisador, especialização do conhecimento tem
Para o historiador, especialização significa saber mais sobre menosLucas Braga / UFMG

Especialização
Peter Burke explicou que a diminuição dos polímatos está relacionada à especialização do conhecimento, que surgiu, inicialmente, no campo da medicina. Para ele, essa especialização tem um lado negativo, pois se desenvolve em prejuízo do conhecimento geral. “Os polímatos conseguem observar conexões inesperadas entre os campos. Eles avaliam uma disciplina por meio de um olhar treinado em outra disciplina. Ao contrário da especialização, esse modo de pensar unifica o conhecimento, e isso é muito positivo. O conhecimento especializado significa saber mais sobre cada vez menos assuntos”, afirmou.

O pesquisador reconheceu que os polímatos estão na contramão da tendência de especialização do conhecimento, mas defendeu a formação de estudiosos dedicados a vários campos do conhecimento. “Precisamos de generalistas do conhecimento. Eles são pessoas curiosas, competitivas e com a capacidade de concentrar sua ação em campos distintos. Antes era normal o professor ser de uma área e ministrar aulas em outros campos. Isso tem se tornado cada vez mais raro, mas precisa ser resgatado”, concluiu.

Peter Burke
O convidado da série Desafios contemporâneos é doutor em História pela Universidade de Oxford (Inglaterra). Foi docente da Princeton University (EUA) e professor-visitante do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo (USP), onde desenvolveu o projeto de pesquisa Duas crises de consciência histórica. Especialista em Teoria da História e do Conhecimento, Burke enfatiza, em suas análises, a relevância dos aspectos socioculturais. Tem mais de 28 livros publicados e traduzidos para 31 idiomas.

O reitor da UFMG, Jaime Arturo Ramírez, e a professora da Faculdade de Letras, Juliana Gambogi, participaram da abertura da palestra
O reitor Jaime Ramírez e a professora da Fale Juliana Gambogi compuseram a mesa com o historiadorLucas Braga / UFMG

Gilberto Freyre

A série UFMG, 90: desafios contemporâneos encerra-se na quinta-feira, dia 23, com a conferência Gilberto Freyre: nosso contemporâneo?, que será proferida pela historiadora Maria Lúcia Garcia Pallares-Burke. Pós-doutora pela Universidade de Cambridge (Inglaterra), ela foi professora da Faculdade de Educação da USP, onde obteve os graus de mestre, doutor e livre docente. Pesquisadora associada do Centre of Latin American Studies da Universidade de Cambridge, tem-se dedicado ao estudo da circulação e recepção de ideias nos contextos europeu e latino-americano e à trajetória intelectual de pensadores como Gilberto Freyre, Rüdiger Bilden e Anísio Teixeira. A conferência começa às 10h, no auditório 104 do Centro de Atividades Didáticas de Ciências Humanas (CAD 2)

Em conversa com a TV UFMG, Peter Burke falou sobre os principais pontos de sua conferência. Assista ao vídeo:

 

Luana Macieira