Pesquisa e Inovação

Prevenção de interações medicamentosas pode otimizar tratamento de pessoas com HIV

Em dissertação na Faculdade de Medicina, farmacêutica avaliou pacientes do Centro de Treinamento e Referência Orestes Diniz

Pesquisadora aponta automedicação como geradora das interações entre os medicamentos
Automedicação é apontada como causa de interações negativas entre os medicamentos Carol Morena / Faculdade de Medicina

A interação de antirretrovirais com outros medicamentos pode provocar respostas imprevisíveis do organismo, comprometendo tanto o tratamento antirretroviral quanto a eficácia das outras substâncias utilizadas, indica estudo pioneiro no Brasil, realizado no Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde – Infectologia e Medicina Tropical, da Faculdade de Medicina. 

Na dissertação de mestrado Perfil das interações medicamentosas com a terapia antirretroviral em pacientes vivendo com HIV e aids em um serviço de referência em Belo Horizonte, defendida pela farmacêutica Betânia Maria Pontelo, a pesquisadora avaliou, em pessoas soropositivas, as alterações dos efeitos de determinado medicamento em função de outro medicamento, alimentos ou bebidas.

Em sua pesquisa, Betânia Pontelo entrevistou 304 pacientes, 76% deles com menos de 50 anos, acompanhadas pelo Centro de Treinamento e Referência em Doenças Infectocontagiosas e Parasitárias (CTR/DIP) Orestes Diniz, anexo do Hospital das Clínicas. As entrevistas, realizadas de junho de 2015 a junho de 2016, mostraram que 50% dos pacientes estabeleciam ao menos uma interação medicamentosa.

“O maior problema ainda é a automedicação. Às vezes, o uso de determinado remédio para combater uma dor de cabeça pode gerar graves problemas ao interagir com o tratamento antirretroviral, contra o vírus HIV. Em casos extremos, a interação pode levar à morte”, afirma a autora do estudo, que acredita na importância de um trabalho multiprofissional para a eficácia do tratamento dos pacientes soropositivos.

Comorbidades
A motivação do estudo partiu da percepção da existência da interação medicamentosa e da polifarmácia, caracterizada pelo uso de cinco ou mais medicamentos pelos pacientes. O início prematuro de comorbidades médicas, ou seja, a presença ou associação de duas ou mais doenças no mesmo paciente, somadas à idade, é um fenômeno chamado de envelhecimento acelerado na infecção pelo HIV. Basicamente, refere-se ao aparecimento precoce de algumas doenças em consequência da infecção viral, toxicidade cumulativa da terapia antirretroviral de longo prazo e/ou maior frequência de uso de tabaco e outras substâncias.

Segundo Betânia Pontelo, as interações medicamentosas mapeadas no estudo não impactam a eficácia do tratamento antirretroviral. Entretanto, a farmacêutica ressalta que a incidência de doenças cardiovasculares, de câncer não relacionado ao HIV e de insuficiência renal e hepática é maior entre as pessoas com mais de 50 anos que vivem com HIV do que entre indivíduos da mesma faixa etária que não possuem o vírus. Além disso, a combinação de efeitos de medicamentos, doenças crônicas precoces, toxidade cumulativa e uso de drogas como tabaco, por exemplo, pode resultar na perda de eficácia dos medicamentos que não são os antirretrovirais.

“Pacientes com HIV e aids são mais propícios a desenvolver doenças crônicas e mais cedo, devido ao enfraquecimento de seu sistema imunológico. Dessa forma, a tendência é que seja necessária a utilização de mais medicamentos, aumentando ainda mais o risco dessas interações”, esclarece.

Trabalho multiprofissional
Para Betânia, a maior frequência de interações em pacientes acima de 50 anos e o esperado aumento do número de medicamentos sugerem que o envelhecimento das pessoas com HIV aumentam os riscos. “Por outro lado, a melhora dos esquemas antirretrovirais, com medicamentos mais seguros e com menor perfil de interações, poderá contrabalancear o efeito do envelhecimento”, pondera a autora.

Os resultados do estudo indicam a necessidade de que as equipes de saúde tenham conhecimento de todos os medicamentos que estão sendo utilizados pelos pacientes e dos riscos da polifarmácia, sendo capazes de orientar os pacientes quanto às interações.

O próximo objetivo da pesquisadora é expandir os resultados da pesquisa para outras unidades de saúde. “Com um trabalho multiprofissional, será possível evitar as interações clinicamente significativas de antirretrovirais com outros medicamentos, otimizar o tratamento do paciente e atribuir uma melhor qualidade de vida às pessoas que vivem com HIV”, conclui.

Dissertação: Perfil das interações medicamentosas com a terapia antirretroviral em pacientes vivendo com HIV e aids em um serviço de referência em Belo Horizonte
Autora: Betânia Maria Pontelo
Programa: Pós-graduação em Ciências da Saúde – Infectologia e Medicina Tropical
Orientador: Unaí Tupinambás
Coorientador: Dirceu Bartolomeu Greco
Defesa: 24 de agosto de 2017

Carol Prado / Faculdade de Medicina