Pesquisa e Inovação

Respostas às pandemias hoje são mais rápidas, afirma pesquisadora italiana

Uma das primeiras cientistas a publicar sobre o coronavírus na Europa, Marta Giovanetti analisa o cenário da epidemia e os esforços da comunidade mundial para contê-la

O mapa interativo atualizado diariamente pela Johns Hopkins University, dos Estados Unidos, mostra a dimensão do alcance do SARS-CoV-2, o novo coronavírus, no mundo. Mais de 116 mil casos da infecção Covid-19 foram confirmados em todos os seis continentes, provocando, até o momento, cerca de quatro mil mortes.

“Os números sobem todos os dias. Por ser um vírus respiratório, de transmissão aérea, é difícil restringir sua circulação”, explica a pesquisadora italiana Marta Giovanetti, professora visitante da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e integrante do corpo docente do Programa Interunidades de Pós-graduação em Bioinformática da UFMG. “Desde os primeiros casos na China, ele foi se espalhando pelo mundo, tornando-se uma preocupação de saúde pública”, afirma.

Apenas em 2020, Marta, que trabalha em um projeto de vigilância genômica dos patógenos arbovirais emergentes no Brasil, integrou pesquisas que resultaram na publicação de quatro artigos sobre o coronavírus, além de ter sido uma das primeiras a analisar a estrutura do genoma do vírus na Itália.

A pesquisadora participou, na semana passada, no ICB, de atividades da disciplina Técnicas modernas para modelagem de doenças Infecciosas e conversou com a reportagem sobre o cenário da epidemia. Os principais trechos da conversa estão registrados em vídeo da TV UFMG e na entrevista que se seguem:


Até o momento, são 25 casos de Covid-19, a infecção provocada pelo novo coronavírus, confirmados no Brasil. Existe risco de epidemia por aqui?
Por ser um vírus respiratório, de transmissão via aérea, a gente sabe que, de fato, não existem grandes formas de precaução – além de, obviamente, as preconizadas pelo Ministério da Saúde, como lavar as mãos várias vezes e utilizar a máscara em lugares muito poluídos. Mas, com certeza, no caso brasileiro, a grande barreira para a transmissão e dispersão do vírus é o clima e a estação do ano. Isso pode evitar uma grande epidemia aqui no país.

Após a confirmação desses casos, houve também uma explosão de casos suspeitos ao redor do país. Existe explicação para isso?
Isso sempre acontece no curso de uma epidemia. Como pesquisadores, a nossa obrigação é tentar correr, não para dar notícias, mas para fazer ciência. Trabalhamos para encontrar respostas para que as autoridades de saúde pública e as autoridades locais estejam prontas para enfrentar e conter essa epidemia. Além disso, é preciso considerar que muitos casos são notificados devido a certo alarmismo midiático. Durante uma epidemia como essa, um simples resfriado poderia ser considerado um dos sintomas do coronavírus. É preciso utilizar uma balança criteriosa para tentar conter ou discriminar os possíveis casos suspeitos.

Existe uma grande variedade sequenciada de genomas e materiais genéticos desse novo coronavírus, o que indica também uma alta possibilidade de mutação do próprio vírus...
A característica intrínseca de um vírus é sua capacidade de acumular mutações em seu genoma ao longo do tempo. Isso é parte do mecanismo de defesa do vírus à resposta imune do hospedeiro. Para se replicar, o vírus precisa acumular mutações ao longo do genoma para sobreviver – caso contrário, ficaríamos imunes a ele. O que é importante no curso de epidemias como essa é a geração de dados genômicos completos para que seja possível decifrar a combinação das bases nucleotídicas do patógeno responsável por determinada epidemia, identificar mutações que poderiam ser específicas do surto que está sendo registrado em uma área específica do mundo e também para compreender melhor os mecanismos patogenéticos do vírus, ou seja, como o vírus é capaz de gerar, se for capaz de gerar, uma gravidade clínica diferenciada em pacientes diferentes. Por fim, isso também é importante, como mencionou o professor Vasco [Azevedo, chefe do departamento de Biologia Geral da UFMG], para tentar estabelecer terapias para pacientes específicos e o desenvolvimento de vacinas e métodos de diagnóstico que possibilitam a detecção rápida desses patógenos.

Não há garantia, por exemplo, de que uma pessoa infectada pelo coronavírus torne-se imune a ele?
Isso a gente não pode, nesse momento, afirmar. Estamos experimentando a emergência do patógeno pela primeira vez, então vários estudos ainda estão sendo realizados. Quanto à imunidade em relação ao vírus, é preciso aguardar um tempo.

Poderia explicar como ocorre a colaboração entre pesquisadores. Quais são as potências e limitações da pesquisa neste momento?
Uma coisa que precisamos considerar na pesquisa é que, de fato, ninguém faz nada sozinho. Conseguimos alcançar grandes resultados se colaboramos e trabalhamos em conjunto, unindo, obviamente, forças diferentes, em âmbito mundial. Plataformas de compartilhamento de dados e estudos, como o Virological, são muito importantes para a comunidade científica. Já é possível observar, durante essa nova emergência, como as coisas mudaram desde 2016. Durante a epidemia do vírus zika, demoramos um tempo para que fosse possível, com grande rapidez, gerar sequências genômicas completas. Agora, com dois, quase três meses de epidemia, estão disponíveis mais de 150 genomas completos do coronavírus, isolados em várias países do mundo. Isso significa que a comunidade científica está se tornando também mais forte e pronta a responder com mais rapidez a emergência de um determinado patógeno.

Dada essa rápida e fácil transmissão do vírus, que cenários podem ser desenhados?
Previsões não conseguimos fazer. Precisamos dispor de técnicas científicas para detectar o coronavírus rapidamente. Isso ajuda na tomada de decisões em saúde pública. Por outro lado, insisto, é preciso fazer um esforço mundial para que seja possível, juntando expertises diferentes, responder rapidamente a essa nova ameaça.


Gabriel Araújo