Sandra: ‘Eu e a UFMG somos quase uma só na cidade que escolhemos como destino'
Reitora é a nova cidadã honorária de BH
Ao receber o título de cidadã honorária de Belo Horizonte na noite desta terça-feira, dia 28, a reitora Sandra Regina Goulart Almeida destacou que a homenagem não era destinada a apenas a ela, “mas também à própria UFMG, ao papel que teve e que continuará a ter na vida da capital das Minas Gerais”.
Em cerimônia realizada na Câmara dos Vereadores, em um plenário repleto de colegas e amigos – em grande parte vinculados à própria UFMG – e familiares, Sandra Goulart Almeida fez um discurso emocionado, no qual destacou a sua relação com a capital mineira. Nascida em Pains, no Oeste de Minas, Sandra chegou a Belo Horizonte em 1981 para fazer vestibular na UFMG.
“[Aqui] me deslumbrei com o anonimato e a liberdade da cidade grande, por vezes, cosmopolita demais para uma jovem interiorana, mas disposta a viver intensamente cada minuto na cidade e na universidade”, disse ela. Quase quatro décadas depois, agora na condição de reitora da principal universidade de Minas, Sandra ressaltou sua profunda ligação com a instituição e, por conseguinte, com a cidade. “Mais do que nunca, eu e minha UFMG somos quase uma só na cidade que escolhemos como porto e destino”.
Sonho inconfidente
Apenas 30 anos, lembrou Sandra Goulart, separam o nascimento de Belo Horizonte e o da UFMG. Enquanto a primeira foi fundada em 1897, a segunda surgiu em setembro de 1927, com a união da Faculdade de Direito, da Escola Livre de Odontologia, da Faculdade de Medicina e da Escola de Engenharia. “A UFMG é parte constitutiva do projeto da própria criação de Belo Horizonte, cidade que se desenhou na articulação de ideais republicanos e de um projeto de modernidade para o estado e para o país”, afirmou a reitora, lembrando, que na prática, a criação da UFMG materializou, de forma tardia, um projeto dos inconfidentes: “Aqui finalmente se instalava uma Universidade”.
Uma universidade que cresceu e se qualificou nas décadas vindouras, como revelam os vários indicadores mencionados pela homenageada, como o conceito 5 (máximo) na avaliação de cursos e índice global no MEC, o maior percentual de programas de pós-graduação de excelência internacional, a liderança nacional no ranking de patentes e inovação e seu posicionamento de destaque em rankings de universidades.
Apesar dessa excelência, a UFMG, como ressaltou a reitora, está às voltas com um bloqueio de recursos de 30% que afeta todas as suas atividades e retrocede seu orçamento a patamares de 2009, antes da expansão quantitativa e qualitativa experimentada na última década. “Por trás desses cortes [R$ 64,5 milhões], estão custos operacionais, mas também estão também trabalhadores que correm o risco de perderem seus empregos, estão professores que têm tido de pagar reagentes e materiais de ensino, pesquisa e extensão com recursos do próprio bolso e estudantes que dependem de suas bolsas de pesquisa ou extensão para o seu sustento”, lamentou Sandra Goulart Almeida.
Belo Horizonte do futuro
Na parte final de seu pronunciamento, a professora discorreu sobre o conceito da “era da incerteza”, que altera a própria concepção de futuro – “as narrativas que havíamos construído sobre aquilo que seríamos e sobre como viveríamos como que desmancham no ar” – e propôs uma reflexão sobre o próprio futuro de Belo Horizonte e sobre a contribuição que a UFMG pode dar a ele. “Como será a Belo Horizonte do futuro? O que essa escolha implicará para os cidadãos dessa polis?”, perguntou.
E em resposta, ela disse esperar que esse porvir não se eternize nos versos críticos de Carlos Drummond de Andrade – “um triste horizonte e destroçado amor”. “Que seja Belo Horizonte que sempre imaginei para mim e para todos os belo-horizontinos: uma cidade que valoriza o conhecimento e a educação, uma cidade que respeita a diversidade e a diferença, uma cidade acolhedora e inclusiva, digna de ser chamada de polis, uma comunidade formada por cidadãos e cidadãs livres e iguais”. E concluiu, colocando a UFMG à disposição da cidade e recorrendo, mais uma vez, ao poeta maior da literatura brasileira: “Onde não há jardim, as flores nascem de um secreto investimento em formas improváveis”.
Ato político
Autor da proposta de homenagem à reitora Sandra Goulart Almeida, o vereador Arnaldo Godoy disse que a sessão de ontem representou um “ato de repúdio” aos ataques ao conhecimento e à intelectualidade e ao desprezo pelo avanço da ciência e da compreensão da história do Brasil. “Precisamos organizar uma resistência suprapartidária para o país não cair no retrocesso e no obscurantismo. Você [Sandra] há de me perdoar por transformar essa homenagem em ato político”, destacou o vereador, que também conduziu a sessão.
O professor Tomaz Aroldo da Mota Santos, reitor da UFMG de 1994 a 1998, saudou a “nova belo-horizontina” e lembrou os momentos de dificuldades vividos pela instituição. “Mas estamos em muito boas mãos para resistir a elas”, afirmou o professor, em referência à liderança exercida pela professora Sandra.
A deputada estadual Beatriz Cerqueira, que preside a Comissão de Educação da Assembleia Legislativa, afirmou que o título conferido à reitora da UFMG era uma “homenagem ao protagonismo da mulher”. O professor Alessandro Moreira Fernandes, que se definiu como um “fiel escudeiro” de Sandra, declarou que se sentia “honrado” em ser seu vice-reitor. “Não pareço, mas sou um sujeito muito ansioso. E essa ansiedade acaba quando chego à Reitoria e conversamos sobre as atividades do dia”.
O vice-prefeito Paulo Lamac, a deputada federal Jô Moraes, o promotor Edson Ribeiro Baeta e a secretária de Educação de Belo Horizonte, Angela Dalben, também docente da UFMG, completaram a mesa da sessão.
Música
A cerimônia contou ainda com a execução do Hino Nacional brasileiro pelo flautista e pró-reitor de Planejamento, Maurício Freire Garcia. Ele também executou o choro Naquele tempo, de Pixinguinha. Um dos pontos altos da cerimônia também teve a música como protagonista. Foi quando o próprio vereador Arnaldo Godoy puxou o refrão da música O que é o que é, de Gonzaguinha, outro forasteiro que escolheu Belo Horizonte para viver. Ritmada por palmas, a cantoria que se formou em seguida soou como uma mensagem de esperança em tempos turbulentos. Afinal, "a vida devia ser bem melhor e será".