Vacina de DNA contra variantes da covid-19 demonstra eficácia em ensaios com animais
Imunizante baseado em plataforma desenvolvida no ICB teve desempenho semelhante ao da Pfizer/BioNTech em testes pré-clínicos
A pandemia da covid-19 foi controlada, mas as variantes do vírus Sars-CoV-2 ainda preocupam os pesquisadores. Ainda na busca por novos imunizantes, um grupo de pesquisadores do Instituto Ciências Biológicas (ICB) da UFMG desenvolveu uma plataforma de nanopartículas lipídicas para identificar imunizantes eficazes contra variantes da infecção.
Os passos do estudo que levou ao desenvolvimento dessa plataforma estão detalhados no artigo Nanoparticle-based DNA vaccine protects against Sars-CoV-2 variants in female preclinical models, publicado no mês passado na revista Nature Communications. A tecnologia empregada pelo grupo é diferente da utilizada nas vacinas de RNA. “Apesar da semelhança com as vacinas de RNA já aprovadas, nossa abordagem é diferente porque utiliza DNA encapsulado em nanopartículas lipídicas", explica o professor Pedro Pires Goulart Guimarães, do Departamento de Fisiologia e Biofísica do ICB e coordenador do estudo.
O grupo de pesquisa já concluiu os testes pré-clínicos da vacina, incluindo a avaliação de sua eficácia e imunogenicidade em camundongos e hamsters. Lays Cordeiro Guimarães, doutoranda responsável pela pesquisa, explica o processo de desenvolvimento da plataforma, comparando-a a uma biblioteca de nanopartículas, em que cada nanoformulação carrega um código de barras de DNA distinto.
Mistura de nanoformulações
“Preparamos uma mistura de todas as nanoformulações da biblioteca e injetamos em um mesmo animal e, por meio de equipamentos e técnicas, conseguimos identificar qual a melhor formulação para entrega de DNA em cada parte do organismo”, explica. Após seleção criteriosa, a melhor formulação para entrega de DNA em órgãos linfoides foi identificada e utilizada para encapsular o DNA que codifica a proteína spike do vírus da covid-19.
Os resultados dos testes demonstraram resposta imunológica eficaz nos animais que receberam a vacina e são comparáveis aos da vacina da Pfizer/BioNTech, que utiliza a tecnologia de RNA. “Os resultados foram semelhantes nos grupos que usaram a nossa vacina e naqueles imunizados com a vacina de RNA da Pfizer/BioNTech. As reduções de lesão pulmonar, carga viral e letalidade foram semelhantes em ambos os grupos", explica Lays. Os resultados observados nos grupos imunizados com vacina de DNA são promissores, especialmente considerando os desafios apresentados pelas variantes do vírus Sars-CoV-2.
O trabalho reuniu os pesquisadores Frederic Frézard, Mauro Martins Teixeira, Vivian Vasconcelos Costa e Renato Santana de Aguiar, todos do ICB. Também participaram pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz Minas), da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade da Pensilvânia e da Universidade de Wisconsin, ambas nos Estados Unidos.
O projeto recebeu suporte do Laboratório de Biofísica de Sistemas Nanoestruturados da UFMG (Labnano), da Pró-reitoria de Pesquisa da UFMG, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Dengue (INCT-Dengue).
Plataforma adaptável para outras doenças
Lays Guimarães explica que as vacinas de ácidos nucleicos ganharam destaque após aprovação das vacinas de RNA contra covid-19, como as das empresas Moderna e Pfizer. Para a pesquisadora, tal plataforma tecnológica pode ser adaptada para pesquisas de imunizantes contra outras doenças. “A chikungunya, por exemplo, pode deixar sequelas graves, e ainda não existe vacina contra essa doença no Brasil. Uma parte do nosso grupo está fazendo os testes para a chikungunya, e é possível que essa tecnologia seja testada para muitas outras doenças.”
O trabalho que culminou no artigo publicado na Nature Communications foi desenvolvido no Laboratório de Biossegurança Nível 3 (NB3) do ICB. A instalação, que se destina a pesquisas com vírus, bactérias, fungos e outros microrganismos causadores de doenças transmitidas pelo ar, entrou em operação em janeiro de 2022. Também chamada de laboratório de contenção, a estrutura oferece o nível de segurança necessário para acelerar estudos com microrganismos potencialmente ameaçadores para a sociedade.
Artigo: Nanoparticle-based DNA vaccine protects against Sars-CoV-2 variants in female preclinical models
Autores: Lays Cordeiro Guimarães, Pedro Augusto Carvalho Costa, Sérgio Ricardo Aluotto Scalzo Júnior, Heloísa Athaydes Seabra Ferreira, Ana Carolina Soares Braga, Leonardo Camilo de Oliveira, Maria Marta Figueiredo, Sarah Shepherd, Alex Hamilton, Celso Martins Queiroz-Junior, Walison Nunes da Silva, Natália Jordana Alves da Silva, Marco Túllio Rodrigues Alves, Anderson Kenedy Santos, Kevin Kelton Santos de Faria, Fernanda Martins Marim, Heidge Fukumasu, Alexander Birbrair, Andréa Teixeira-Carvalho, Renato Santana de Aguiar, Michael J. Mitchell, Mauro Martins Teixeira, Vivian Vasconcelos Costa, Frederic Frezard e Pedro Pires Goulart Guimarães
Publicado na Nature Communications em janeiro de 2024 e disponível on-line.