Pesquisa do Ipea mostra que cultura é privilégio da elite
Um décimo da população mais rica consome metade dos bens culturais do País
Cultura é um bem de luxo no Brasil. No ápice da pirâmide social, os 10% de brasileiros mais ricos desembolsam a metade dos R$ 40 bilhões gastos anualmente com cultura no País, segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apresentado na mesa-redonda A economia da cultura no Brasil os desafios de uma análise integrada. O debate contou com a presença do ministro da Cultura, Francisco Weffort, e teve como mediadora a vice-reitora Ana Lúcia Gazzola. Desenvolvido a partir da comparação entre os dados apurados pela Pesquisa de Orçamento Familiar do IBGE de 1987 e 1996, esse é o primeiro estudo brasileiro sobre os aspectos econômicos da cultura no País.
De acordo com o levantamento, 10% da renda familiar dos brasileiros cobre todos os gastos com livros, cinema, CDs, bens audiovisuais, turismo e educação, dentre outros. Os ricos gastam cem vezes mais que os pobres com cultura. Os 10% mais pobres destinam 4% da renda mensal ao consumo cultural, enquanto os mais abastados gastam nessa área 13% de seus ganhos. "A concentração social de gastos em cultura é ainda maior do que a de renda", comparou o conferencista Ricardo Paes de Barros, diretor de Políticas de Estudos Sociais do Ipea, ao lembrar que, de um modo geral, os 10% mais ricos detêm 40% do consumo nacional.
A pesquisa mostra ainda que os gastos com cultura mantiveram-se estáveis nos últimos 10 anos, enquanto a renda per capita aumentou, "de onde se conclui que nossa despesa com cultura caiu", disse Barros. Para ele, é necessário que o Brasil esteja mais atento a esse tipo de oscilação para que sejam criadas políticas públicas afinadas com as reais demandas da população. "A área de cultura pode gerar mais empregos que a indústria automobilística e precisa ser bem conhecida para ser explorada", argumentou Ricardo de Barros.
Weffort concordou com as idéias do especialista do Ipea e disse estar con-fiante no aproveitamento da pesquisa para definir algumas intervenções do Estado na área cultural. "Tenho certeza de que esse estudo vai prosseguir e continuar nos alertando para temas ainda não vistos. E, se a cultura é luxo, precisa deixar de ser urgentemente", afirmou.
O estudo mostra que os ricos gastam 60 vezes mais com educação do que os pobres. Enquanto a elite destina 38% de seus dispêndios culturais à educação, os menos favorecidos gastam 18%. Além disso, os 10% mais ricos são responsáveis por 50% dos gastos com aquisição de livros.
Outro campo polarizado são os gastos com turismo. Os ricos são responsáveis por 75% dos gastos efetuados. Os pobres gastam 5% do orçamento cultural em atividades turísticas, e os ricos, 28%.
A população da base da pirâmide social, segundo a pesquisa do Ipea, concentra seus dispêndios culturais em bens audiovisuais, que representam 61% de seus gastos. Nessa área, os ricos gastam 14%.
Belo Horizonte
A pesquisa do Ipea revela que Belo Horizonte é uma das capitais brasileiras onde mais se gasta em cultura no Brasil. Aqui, 31% do dispêndio familiar per capita vai para a área de cultura, contra uma média nacional de 27%.
De acordo com o estudo, a capital mineira é onde mais se gasta com cinema, aluguel de fitas de videocassete e compra de livros não didáticos no País. Entre as famílias pesquisadas, 10% responderam que haviam comprado ingressos para sessões cinematográficas no mês anterior, quando a média nacional é de 8%, chegando a 6% no Rio de Janeiro. Em Belo Horizonte, 21% dos entrevistados responderam ter alugado fita no mês anterior, para uma média brasileira de 17%. Quanto aos livros não-didáticos, 10% disseram ter adquirido pelo menos um no mês anterior à aplicação do questionário, quando a média nacional é de 5%.
Outra característica dos mineiros é a pouca disposição para passar os finais de semana em Belo Horizonte, o que foi apurado através dos gastos com compra de passagens intermunicipais. Enquanto 12% das famílias brasileiras responderam ter gasto dinheiro para deixar suas cidades no mês anterior à pesquisa, em BH esse índice chegou a 26%, seguido dos 17% registrados no Distrito Federal.