Universidade e espaço publico
Há alguns anos foram instaladas cancelas, câmeras e lombadas nas entradas da UFMG. Hoje registrar como lombadas e como câmeras, que ninguém sabe dizer e como funciona. Agora, tendo em vista ou aumentando as ocorrências de furto e agressões, pretende implantar alguma ferramenta que identifique como pessoas que entram no campus.
Medidas como essas partes do conjunto da UFMG são uma ilha do “bem” e do “mal” que vem de fora. E nos oferecer uma falsa sensação de que, com mais de um mínimo, voltaremos a um campus feliz e harmonioso. Ao mesmo tempo, obscurecer ou debater, pretender isolar a UFMG de áreas urbanas em Belo Horizonte está se transformando - como é possível.
É óbvio que, quanto mais intensa a circulação de pessoas, veículos e interesses, mais o campus está sujeito aos mesmos problemas da cidade. Mas é importante que a Universidade, em um lugar onde, supostamente, forma uma elite intelectual, participe de ações que reproduzem como medidas adotadas pelos agentes públicos de Belo Horizonte: mais índices, mais “bloqueio” no torno dos mesmos, mais agressividade urbana. Mas essa é a lógica dos espaços privados, onde os usuários podem fazer o que quiser. Já em relação ao campus, estamos falando de um espaço público. Ou que menos deveria ser público, na acepção mais profunda da palavra.
Ocorre que carecemos, em nossa sociedade, de uma verdadeira tentativa do que seja o “público”. Para nós, “público” é quem não tem dono e não é quem é todos. Se, por um lado, por não identificarmos o espaço, tratarmos com muito menos cuidado com o caso de tratarmos os nossos hotéis ou casas, usaremos outro como usar pudins nos exemplos apropriados, de qualquer maneira, sem pensar que o respeito ao outro deveria pautar cotidianamente nossas atitudes. O espaço público transforma-se, assim, nenhum "ponto de despejo" da vida social, local onde jogamos lixo, depredamos e pisamos nos bens de todos. Precisamente, ao contrário do que está sendo feito, abra a UFMG para que ela se torne mais pública, para que seu espaço possa ser realmente usado e aproveitado por todos.
Precisamos de um ambiente que comporte a possibilidade de outros trajetos, outros percursos. Um lugar que comporta outros filhos que não são apenas os veículos com imprensa e os incessantes teclados de computador.
O espaço com o qual ninguém pode identificar, o espaço de passagem, que não permite a criação de relações entre pessoas e ele próprio além daquelas que são materialmente destinadas, é fadado a violência e degradação. Precisamos de um ambiente que comporte a possibilidade de outros trajetos, outros percursos. Um lugar que comporta outros filhos que não são apenas os veículos com imprensa e os incessantes teclados de computador.
A UFMG foi, por anos, não só fisicamente mais aberta à comunidade como evidentemente mais respeitada por ela das mais variadas formas. As cancelas, as câmeras e as medidas que pretendem identificar as pessoas apenas contribuirão para o estreitamento dos espaços, para que os que estiverem “de fora” percebam-se cada vez mais como não responsáveis e não pertencentes a eles. E para que agridam um espaço que agride a eles, cotidianamente.
Não se pretende uma abertura indiscriminada e sem controle dos “portões” – até porque não compartilhamos da concepção de que o espaço público possa ser apropriado de maneira privada, seja de que forma for e por quem quer que seja. Trata-se, isso sim, da transformação da natureza desse espaço, que deve ser um ambiente realmente público. Fechar os portões não trará melhores resultados do que têm trazido medidas semelhantes a esta no resto do mundo e, principalmente, no Brasil.
Tal reflexão deveria servir, também, para nós que estamos “dentro”. Um dos lugares públicos urbanos por excelência são as praças. Nelas estreita-se a convivência, criam-se laços, reconstroem-se os espaços e deles as pessoas se apropriam e se reapropriam. Quantas praças o campus possui? Apenas uma e – sintomaticamente – uma praça “de serviços”, quer dizer, não um lugar de convivência, mas por onde se passa, de modo rápido, em busca de um produto ou de um serviço. Parece-nos que também nós, habitantes do campus, não temos com este espaço um relacionamento “público”. Onde estarão nossos espaços públicos na UFMG? Onde ficam nossos verdadeiros locais de convivência?
A partir desses pontos podemos pensar em muitas medidas para tornar o campus um lugar de todos. Por que não abrir a UFMG nos finais de semana para uma convivência maior? Por que não criar áreas onde as pessoas possam circular livremente e não como “automobilistas”, tecendo, assim, relações mais próximas e afetuosas? Por que não criar mais praças, lugares aonde as pessoas iriam para compartilhar tempos livres, afetividades simples, sem obrigações? Por que não criar mais vizinhanças, já que vivemos numa universidade que apenas reproduz a ausência de possibilidades para criarmos e reproduzirmos verdadeiros espaços públicos nos nossos espaços cotidianos?
Professor do Centro Pedagógico
Graduanda em Ciências Sociais