Proteína contra a transmissão

A UFMG e o mundo

Excelência acadêmica e solidariedade têm sido, desde sempre, dois dos valores fundamentais que constituem os sólidos pilares sobre os quais a Universidade Federal de Minas Gerais, nonagenária instituição brasileira de ensino superior e pesquisa, se edificou. A UFMG tem orientado a sua ação institucional, em múltiplas dimensões e frentes temáticas, por um inarredável compromisso com esses valores. A novidade dos tempos correntes – ensejada, em boa medida, pelo advento de novas dinâmicas educacionais e científicas no planeta interconectado em que vivemos – é que essa peculiar visão sobre o mundo, cultivada ao longo de décadas, por diferentes gerações de membros da nossa comunidade, vem ganhando relevo, visibilidade e, de forma inexorável, tem-se projetado além das fronteiras nacionais.

Nossa doutrina para lidar com o entorno internacional articula-se, de modo muito simplificado, em três níveis operacionais, conexos e interdependentes – o global, o regional e o local. A “política externa” da UFMG, por assim dizer, é o vetor resultante do delicado processamento entre a perspectiva defendida pela Universidade e a diversidade de posições com as quais nos defrontamos, favoráveis ou contrárias a nossos interesses e disposições, cotidianamente e em todos os lugares. 

No plano global, defendemos a noção de que a UFMG deve adotar, em suas relações internacionais, uma concepção universalista. Acreditamos na força do pluralismo, na riqueza do convívio entre os povos, nas infinitas possibilidades que advêm das trocas de saberes. Fazemo-nos presentes em 54 países espalhados pelos cinco continentes, por intermédio de mais de 600 acordos firmados com aproximadamente 430 instituições de educação terciária, cobrindo os mais variados campos do conhecimento. Praticamos, não resta dúvida, o ecumenismo que pregamos. 

Almejamos, porém, um universalismo qualificado. Queremos cooperar com todos aqueles que, imbuídos do ideal da excelência, desejem construir, solidariamente, as bases para o desenvolvimento da ciência, o melhoramento das práticas de ensino e extensão, o aperfeiçoamento da governança universitária. Não há margem, nesse sentido, para um universalismo de fachada, meramente ornamental, preocupado apenas em inflar números, gerar convênios sem efetividade ou produzir documentos em larguíssima escala. Somos bastante zelosos em relação à qualidade de nossa cooperação acadêmica internacional.

No plano regional, a UFMG é entusiasta de uma aproximação vigorosa com a América Latina. Há boas razões para isso. Uma variável decisiva para explicar a densidade dos fluxos internacionais no campo da educação é a geografia. Não por acaso, Argentina, Chile, Colômbia e Peru são, nos últimos anos, quatro entre os cinco principais países de origem dos intercambistas que frequentam, a cada novo semestre letivo, os nossos campi. Pela mesma lógica, também enviamos uma parcela expressiva de estudantes em mobilidade internacional para o Cone Sul e os Andes. Ademais, ações e projetos internacionais de extensão universitária são catalisados pela contiguidade e familiaridade entre os povos da região. Para não mencionar a contribuição inestimável trazida por professores e pesquisadores estrangeiros da UFMG, permanentes ou visitantes, nascidos em nações vizinhas.

Não se entende a estratégia internacional da UFMG fora do seu contexto regional. Quando evocamos discursivamente a América Latina, estamos a falar, afinal, de 650 milhões de pessoas, ou de quase 10% da população mundial, um gigantesco reservatório de bens naturais, culturais e simbólicos. Há, de resto, o compartilhamento histórico, por parte das instituições de ensino superior latino-americanas, de uma série de desafios políticos e de gestão, bem como a identidade comum que se forjou entre elas. Parece-nos acertada, assim, a aposta em uma plataforma latino-americana para a internacionalização da UFMG.

Finalmente, no plano local, advoga-se por uma internacionalização abrangente e cidadã da UFMG, inclusiva de distintos perfis socioeconômicos, em alinhamento com a missão pública que carregamos. Importa que as três categorias funcionais – docentes, técnicos em educação e discentes – estejam contempladas pelo planejamento e pelas iniciativas levadas a cabo na seara internacional. É necessário balancear a representação dos colégios do conhecimento e procurar, a todo instante, a paridade entre os gêneros. 

A meta da internacionalização abrangente e cidadã coexiste com a necessidade de formar quadros, de habilitar os indivíduos e as coletividades institucionalizadas da UFMG – departamentos, programas de pós-graduação, direções de unidades acadêmicas, órgãos da administração central – para a exploração das oportunidades educacionais e científicas que se apresentam. É nesse marco que se inserem propostas recentes, empreendidas pela DRI, para a capacitação de pessoal técnico-administrativo e a promoção de proficiência linguística, como a implantação de uma “Formação Transversal em Estudos Internacionais”, ministrada em inglês e espanhol, para os estudantes de graduação.

Desafios de monta permanecerão no horizonte da internacionalização do ensino superior brasileiro. Sabe-se de antemão que o percurso será turbulento, mas não há rotas alternativas. Há que seguir adiante. A boa notícia é que a UFMG tem um plano, maturado colegiadamente, para enfrentar com altivez e criatividade as adversidades, extraindo desse trajeto importantes recompensas para a comunidade acadêmica. Cumpre-nos, daqui por diante, implementá-lo com a máxima sensibilidade e firmeza de propósito.

Aziz Tuffi Saliba e Dawisson Belém Lopes / Diretor e diretor-adjunto de Relações Internacionais da UFMG