BH: uma narrativa espacial

Matemática para a vida

UFMG vai reunir pesquisadores e educadores para discutir novas tendências e estratégias para o ensino da disciplina

Alunos da turma da professora Petrina Avelar em atividade inspirada na modelagem matemática
Alunos da turma da professora Petrina Avelar em atividade inspirada na modelagem matemática Arquivo Petrina Avelar

“Aprender matemática, pra quê?” A questão, formulada por estudantes e que volta e meia angustia os professores nas salas de aulas, apresenta-se como um desafio para o ensino dessa disciplina. Mas quando a matemática torna-se uma ferramenta na resolução de problemas práticos, vivenciados pelos próprios alunos, a pergunta cede lugar à investigação e ao compartilhamento de conhecimentos.

Essa é a característica essencial da modelagem matemática, uma das tendências da educação matemática, que será tratada durante encontro nacional, de 14 a 16 de novembro, no Instituto de Ciências Exatas (ICEx) da UFMG. 

A 11ª Conferência Nacional sobre Modelagem na Educação Matemática (XI CNMEM), promovida em parceria com a Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM), reunirá professores, pesquisadores e estudantes de licenciatura de todo o país. As inscrições estão abertas no site do evento, onde estão disponíveis mais informações e a programação, que inclui palestras, apresentação de trabalhos, debates e minicursos.

A modelagem matemática transforma a configuração da sala de aula, como relata a professora do Departamento de Matemática do ICEx e organizadora do evento, Jussara de Loiola Araújo. Segundo ela, o professor deixa seu tradicional lugar à frente da sala, como transmissor de conteúdos, para tornar-se um tutor e instigador, e os alunos transformam-se em protagonistas na resolução dos problemas e na produção do conhecimento. A aula fica mais barulhenta pelos calorosos debates e troca de informações. O quadro-negro passa a ser só mais um entre os diferentes tipos de materiais, como recortes de jornais, computadores, placas de isopor, réguas, tinta, celulares e tantos outros, conforme cada problema proposto. 

Questões provocadas pela campanha de doação de pele humana ou pelos custos do transporte público, na capital mineira, ou ainda pelo desastre do rompimento da barragem de rejeitos do córrego Feijão, em Brumadinho, podem ser discutidas com a ajuda da matemática, associada às contribuições de outros conhecimentos. 

O professor deixa seu tradicional lugar à frente da sala, como transmissor de conteúdos, para tornar-se um tutor e instigador, e os alunos transformam-se em protagonistas na resolução dos problemas e na produção do conhecimento.

Essa quebra de paradigma desafia professores, que, muitas vezes, precisam deixar a programação linear do plano de curso para, até mesmo, introduzir conceitos mais avançados, que seriam vistos apenas em níveis futuros. “Mas é uma opção que compensa, pela motivação provocada nos estudantes”,   avalia Jussara.


Empoderamento 

A educação matemática, que tem como um de seus expoentes o professor Ubiratan D’Ambrósio, desdobra-se em várias tendências ou orientações, que influenciam diretamente a prática em sala de aula. Além da modelagem matemática, contempla o uso de tecnologias, investigações, etnomatemática e história da matemática, entre outras dimensões. São práticas que se opõem ao modelo único e tradicional da transmissão do conhecimento pelo professor e põem a interdisciplinaridade em lugar visível na resolução dos problemas.

A partir dos anos 80, influenciada pelo pensamento de Paulo Freire e do próprio D’Ambrósio, a modelagem matemática ganhou força no Brasil e carrega uma peculiaridade que a difere do resto do mundo. “Internacionalmente, a modelagem matemática está mais voltada para a perspectiva educacional, para o ensino dos conteúdos. No Brasil, o diferencial é que essa perspectiva ganha força política, cultural e social. A abertura para que os próprios estudantes proponham os problemas reflete o objetivo de se educar matematicamente as pessoas para que elas atuem criticamente na sociedade”, compara Jussara Loiola. 

“A matemática é uma linguagem de poder e pode ser usada como instrumento de exclusão. Apenas a formação do professor não garante a prática das tendências na sala de aula, nem uma discussão politizada da matemática. É preciso buscar o compartilhamento com outros profissionais e com os próprios alunos”, defende Jussara Araújo, que também integra o Programa de Pós-graduação em Educação, da Faculdade de Educação (FaE).


Pesquisa e prática

Para a professora Petrina Avelar, da Escola Municipal Minervina Augusta, “o professor precisa ser mais observador da sua própria prática, estar em constante investigação sobre quais possibilidades sua prática oferece para melhorar o aprendizado de seus alunos”.

No início deste ano, Petrina Avelar, mestre em Educação Matemática pela FaE, na linha de tecnologias digitais, registrou, em imagens, um trabalho de modelagem matemática realizado com seus alunos do sexto ano. O vídeo Mar de lama, sobre as etapas de cálculo do volume de lama que deveria ser retirada da área atingida pelo rompimento da barragem do Feijão, em Brumadinho, venceu o 3º Festival de Vídeos Digitais e Educação Matemática, promovido pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). 

“Embora muito novos, com idade entre 11 e 12 anos, os alunos mostraram-se maduros e engajados com questões relacionadas ao assunto. A produção do vídeo também motivou bastante”, relata Petrina, que tem 21 anos de experiência docente e vai participar do Entre-vistas, um debate com outros professores e pesquisadores, que integra a programação da conferência.

Teresa Sanches