Rumo ao terceiro milhar

O papel no palco

Coletânea de ensaios apresenta metodologia de tradução de teatro que mobiliza dramaturgia ainda durante o processo de conversão do texto

Está disponível, nas livrarias, a coletânea de ensaios Teatro e tradução de teatro (estudos) vol. 1, organizada pelas professoras da Faculdade de Letras (Fale) Tereza Virgínia Barbosa, Anna Palma e Ana Maria Chiarini e levada ao prelo pela Relicário Edições. Reunidos, os textos proporcionam acesso a uma inovadora metodologia de tradução de teatro, em que exercícios de dramaturgia são realizados ainda durante o processo de tradução.

Por essa metodologia, o texto traduzido só se consolida no papel depois de os atores testarem e colaborarem na lapidação de cada uma das soluções propostas pelo tradutor. Com a estratégia, busca-se evitar que o produto final comprometa a encenabilidade prevista no texto original.

A ideia por trás desse processo é a de que o lugar por excelência do teatro é o palco, e não a página do livro. “Construímos essa metodologia horizontalmente, unindo a Fale e a Escola de Belas Artes (EBA), a partir de 2009. Foi um processo do qual participaram professores e alunos de graduação e pós-graduação”, explica Tereza Virgínia. No entanto, diz a professora, devido ao seu arrojo transdisciplinar, só agora o método começa a ser mais aceito no Brasil, apesar de praticado há algum tempo no exterior. “Não há mais como fugir. Do meu ponto de vista, não faz mais sentido traduzir teatro sem fazer dramaturgia nesse processo”, afirma.

Tereza Virgínia conta que juntar as competências é a base dessa metodologia de tradução. “Quem atua na área de letras não tem a mesma habilidade dos pesquisadores e atores das artes cênicas para pensar o texto em sua prática dramatúrgica. De igual modo, quem atua com artes cênicas não tem a capacitação de quem atua na área de letras para trabalhar o estabelecimento do texto no papel. Trabalhar juntos possibilitou o nivelamento das diferenças”, defende.

“Em razão desse investimento em se considerar a encenabilidade, a gente já não traduz mais como alguém da Fale. A gente traduz, fala, testa, refaz, realiza os movimentos, testa novamente, para só depois chegar ao texto definitivo. Nesse sentido, realizamos uma tradução que já nasce como dramaturgia e põe fim à antiga polêmica de o texto escrito não ‘significar’ o teatro”, explica.

Tradução em movimento

Os ensaios reunidos no volume compilam os resultados de estudos apresentados inicialmente no primeiro semestre de 2016, durante colóquio realizado pelo Grupo de Tradução de Teatro (GTT), na Fale. Naquela ocasião, a pretensão era justamente alargar os horizontes das pesquisas realizadas pelo grupo sobre essa nova modalidade de tradução e projetar internacionalmente suas atividades.

A obra traz ensaios de pesquisadores da Argentina, do Chile, de Cuba, da Grécia, da Espanha, dos Estados Unidos e da Itália, além de brasileiros. Seus 17 textos reúnem casos de tradução, trabalhos comparativos na área e abordagens de temas mais específicos, como a relação do teatro com a poesia, com a dança e com a filosofia.

Na orelha do volume, a professora Andréia Guerini, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), lembra que esses artigos foram escritos “não somente por reconhecidos pesquisadores nacionais e internacionais, mas também por alunos, atores, produtores, diretores de cena e músicos”. Ao tratarem dessa ideia de “tradução em movimento”, diz Guerini, esses “atores” alargam o “horizonte teórico e prático” da tradução.

A editora da Relicário, Maíra Nassif, explica que o volume 2, que será lançado em breve, trará uma amostra de peças traduzidas por meio dessa metodologia. “A obra contará com textos de Dario Fo, Stefano Benni, Enzo Moscato e Isidora Stevenson”, antecipa.

Reprodução

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Livro: Teatro e tradução de teatro (estudos). Vol. 1

Organizadoras: Tereza Virgínia Ribeiro Barbosa, Anna Palma e Ana Maria Chiarini

Relicário Edições 304 páginas / R$ 38

Ewerton Martins Ribeiro