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‘Política externa brasileira prejudica o combate à pandemia’, analisa professor da UFMG

Em artigo, diretor-adjunto de Relações Internacionais da UFMG, Dawisson Belém Lopes, aponta que pela primeira vez em 200 anos o país não tem uma estratégia para coordenar as relações exteriores

'Relações diplomáticas do governo Bolsonaro se dão preferencialmente com os Estados Unidos', segundo Lopes
'Relações diplomáticas do governo Bolsonaro se dão preferencialmente com os Estados Unidos', segundo Lopes Alan Santos / PR / FotosPublicas CC BY-NC 2.0

Como andam as relações internacionais do Brasil no contexto da pandemia da Covid-19? Mesmo com o alinhamento do presidente Jair Bolsonaro a Donald Trump, com uma série de concessões feitas pelo atual governo brasileiro aos Estados Unidos, em troca de apoio simbólico, Trump foi irredutível no fechamento da fronteira aos brasileiros, há cerca de um mês, com a alegação de proteger a população norte-americana do coronavírus. Outro ponto sensível é a relação do país com a China. Depois das demonstrações de xenofobia por parte de autoridades brasileiras, as relações diplomáticas entre os dois países foram abaladas. Para analisar estas e outras arestas da atual política internacional do Brasil, o programa Conexões, da Rádio UFMG Educativa entrevistou, na segunda-feira, o professor de política internacional Dawisson Belém Lopes, diretor-adjunto de Relações Internacionais da UFMG.

Na última semana, o professor Lopes publicou, ao lado do doutorando em ciência política na UFMG, Thales Carvalho, um artigo jornal O Globo, intitulado “Política externa ou campanha eleitoral por outros meios?” No trabalho, o pesquisador analisa as decisões do governo federal que afetam as relações internacionais brasileiras. “Durante toda a história de quase 200 anos do Brasil como um estado independente, nunca se viu um caso como o atual, em que não há uma formulação racional e estratégica de uma política exterior. O que observamos nesse âmbito é um conjunto de reações de Bolsonaro ao que ele considera conveniente para sua estratégia de reeleição, realizando acenos e agrados pontuais como pretexto para que o presidente alcance sua base”, defende o professor.

Para Lopes, no contexto da pandemia de Covid -19, a postura adotada pelo governo de Bolsonaro nas relações exteriores é ainda mais prejudicial ao país e aos brasileiros. “Esse é o pior momento para uma política externa como a atual”, afirma o professor, “porque a política de Jair Bolsonaro nos isola. Suas ações e discursos criticam o que o governo federal chama de ‘globalismo’, e nos tiram do circuito multilateral”, analisa Lopes. Isso traz impactos diretos no combate à pandemia, como exemplifica o pesquisador: “Com a saída de fóruns de cooperação internacional, o Brasil fica excluído de consórcios que debatem a recuperação econômica pós crise sanitária, de grupos de trabalho para desenvolvimento de vacinas e medicamentos, e de outras parcerias internacionais que poderiam ajudar o enfrentamento à doença”. “Essa política externa traz para o Brasil muitas dificuldades para retomar à vida, quando a crise sanitária passar”, aponta Lopes.

Estados Unidos x China
Durante entrevista para o programa Conexões, o professor e diretor-adjunto de Relações Internacionais da UFMG Dawisson Belém Lopes, analisou a postura do governo federal frente a relação com duas grandes potências mundiais: os Estados Unidos e a China. “O presidente identificou um nicho eleitoral na população brasileira que se alinha aos valores conservadores norte-americanos, e os afaga com a aproximação a essa vertente na política estadunidense”, analisa. “O Brasil tem se relacionado preferencialmente com os Estados Unidos e outra meia dúzia de países”, segundo Lopes. Para o professor, essa postura diplomática pode representar sérios riscos para a relação do país com outro gigante da economia: a China.

“No momento, a China ainda é principal parceiro comercial do Brasil, que depende profundamente dessa relação para manter o seu superávit econômico”, explica Lopes. “Apesar de o governo federal mais atrapalhar que ajudar, com falas deselegantes e até hostis direcionadas à China, essas atitudes ainda não tiveram um impacto tangível entre as relações bilaterais entre os países. Isso se deve a outros atores que influenciam nesse vínculo, como os empresários e os governos estaduais e municipais.” Mas para o professor Dawisson Lopes, essa situação pode mudar em breve. “Há uma disputa global entre os Estados Unidos e a China, e a tendência de Bolsonaro em se alinhar com a política estadunidense pode prejudicar as relações com a China. Vai chegar o momento em que o Brasil será obrigado a tomar partido nessa disputa, e isso pode significar o início da degeneração da relação bilateral entre os países”, analisa Lopes.

Em entrevista à Rádio UFMG Educativa o diretor-adjunto de Relações Internacionais da UFMG falou também sobre as principais mudanças no padrão de votação do Brasil na Organização das Nações Unidas, as posturas ambientais do governo federal e sua repercussão internacional, a possível entrada do país na OCDE, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, e outros tópicos relacionados à política externa brasileira.

Ouça a conversa com Luíza Glória

O artigo publicado pelo O Globo, “Política externa ou campanha eleitoral por outros meios?”, assinado pelo professor Dawisson Belém Lopes e pelo doutorando em ciência política na UFMG, Thales Carvalho, pode ser acessado no site do jornal.