UFMG abrirá “janela de oportunidades” no Pará

Bolos, pacotes e o corte de bolsas

Não sei se a receita estava errada, se faltou fermento ou destreza ao cozinheiro. Enfim, não sei. O fato é que ainda não pude provar a minha fatia (ou seria migalha?) do bolo que levamos ao forno na década de 70 e que deveria crescer para ser dividido entre os brasileiros.

E o mais engraçado é que, apesar de o bolo nunca ficar pronto, as embalagens, ou melhor, os pacotes sempre saltam no capricho. Se me perguntarem quantos já foram de lá para cá, não saberei responder. Já perdi a conta. Aliás, por falar em conta, mesmo este último vai ajudar-nos, os pós-graduandos brasileiros, a permanecer esbeltos, com nenhum dinheiro na conta.

Argumentos para minguar bolsas de mestrado e doutorado não devem faltar aos integrantes da economic team. Eles sempre os têm na ponta da língua e até sabem qual é o caminho das pedras que vai nos tirar de mais essa enrascada. O artigo que sumiu do mercado foi a boa vontade para reconhecer o inegável esforço das universidades públicas para que estudantes de estratos sociais menos abastados possam freqüentar as salas de aula.

Escorados em nhenhenhém, meios de comunicação, incautos e patetas de plantão fazem coro acusando de elitistas as universidades públicas. Eles não vêem, mas a cada ano essas instituições de ensino anunciam a ampliação de vagas, a criação de cursos novos e a abertura de graduações no turno da noite. Na UFMG, particularmente, alie-se o trabalho da Fump, que, com apoios os mais diversos, consegue dar solidez a carreiras acadêmicas que talvez não durassem um semestre sequer por falta de recursos.

Pesquisas já confirmaram que a universidade pública brasileira não é território das elites econômicas. Mas há indagações quanto ao que nos reserva o futuro. Não seria inoportuno, por exemplo, perguntar quais os rumos da pós-graduação diante do anunciado corte orçamentário do governo federal. Nem seria absurdo questionar se, dentro de poucos anos, a pós-graduação das universidades públicas não seria considerada elitista demais para continuar existindo.

São perguntas pertinentes porque, se hoje são cortadas bolsas, amanhã só quem tem fontes alternativas de renda estará cursando a pós-graduação. Disso podem nascer prejuízos múltiplos. Só um exemplo: estudantes do futuro, ao agregarem aos seus cursos atividades que lhes garantam o feijão na mesa, terão menos tempo para leituras e experimentos. A universidade pública, aí sim, poderá estar acolhendo acentuadamente pesquisadores oriundos das camadas mais elevadas da sociedade.

Preocupa também o risco que essa política representa para a perpetuação e ampliação do capital intelectual brasileiro. Quantos seriam os hoje professores desta Universidade que não teriam conseguido concluir suas pesquisas sem o apoio financeiro das bolsas?

A ausência de bolsas cria distorções e premia a elite econômica. O corte de bolsas de estudos pode conduzir à falta de cabeças pensantes para bancar pesquisas de extrema relevância para o Brasil.

Se dúvida ainda houver quanto à importância das bolsas de pós-graduação, pergunte-se: o que seria da medicina em Minas Gerais, para ficar no plano regional, não fosse a Faculdade de Medicina da UFMG, com seus professores qualificados, suas pesquisas, sua extensão? Retorne-se à questão quanto à engenharia, direito, geologia, veterinária...

Murilo Gontijo - jornalista da CCS e aluno do mestrado em Comunicação da Fafich