De casa em casa
Equipe da Escola de Enfermagem visita idosos para diagnosticar precocemente a doença renal crônica
Visitas domiciliares para detecção precoce da doença renal crônica em idosos é a estratégia central do projeto Estudo epidemiológico da doença renal crônica não dialítica em idosos residentes na região Noroeste de Belo Horizonte, Minas Gerais, coordenado pela professora Sônia Maria Soares, da Escola de Enfermagem da UFMG.
O projeto, que teve início em 2010, surgiu da experiência profissional da enfermeira Patrícia Aparecida Barbosa Silva, estudante do Programa de Pós-graduação em Enfermagem. “Detectei que era cada vez maior o número de pacientes que necessitavam do tratamento de hemodiálise. Entretanto, o número de vagas disponíveis era insuficiente para atender toda a demanda”, explica Patrícia.
Constatou-se, então, a necessidade de elaborar estratégia que pudesse intervir nessa realidade. A ideia central era identificar precocemente os estágios iniciais da doença renal crônica e seus fatores de risco. Daí surgiu o projeto, que consiste na abordagem em domicílio de idosos com 60 anos ou mais, residentes na Região Noroeste de Belo Horizonte. Eles são convidados a participar da pesquisa e respondem a um questionário com variáveis socioeconômicas, demográficas e clínicas. O trabalho foi um dos selecionados pela Fapemig para ser apresentado em mostra de inovação realizada no início de agosto.
Para o diagnóstico da doença renal crônica são coletadas amostras de sangue e urina por duas enfermeiras integrantes do projeto. De posse dos resultados dos exames laboratoriais, elas retornam às casas para comunicá-los aos idosos, repassar orientações e entregar material educativo com informações sobre a prevenção.
Desde o início do projeto, foram entrevistados 208 pessoas, das quais 72 apresentavam doença renal crônica. No entanto, apenas nove já haviam sido diagnosticadas. A doença renal crônica caracteriza-se pela lesão dos rins, com diminuição da capacidade do órgão de filtrar o sangue e eliminar a urina. A enfermidade pode manifestar-se em cinco estágios diferentes e é detectada pelas dosagens de creatinina e microalbuminúria no sangue e na urina.
Quando o diagnóstico precoce aponta para os grau 1, 2 ou 3, a atenção básica pode intervir. No grau 3, já é necessário acompanhamento do nefrologista. A detecção precoce dos estágios iniciais da doença renal crônica evita que o paciente evolua para o estágio 5, a forma mais grave e que requer tratamento dialítico”, explica a professora Sônia Maria Soares.
Segundo a professora, a falta de sintomas em pacientes de graus 1 a 3 torna o diagnóstico mais difícil. Como eles podem ser tratados apenas com modificações no estilo de vida, a visita da equipe do projeto é importante para evitar que o estado de saúde dos idosos se agrave. “Nos estágios iniciais, o idoso geralmente nem sabe que tem a doença. Quando o visitamos e diagnosticamos a doença precocemente, conseguimos ajudá-lo a mudar seus hábitos”, diz Sônia Soares.
Envelhecimento
Segundo dados da Sociedade Brasileira de Nefrologia, 10 milhões de brasileiros sofrem de algum tipo de disfunção renal, e mais de 120 mil fazem hemodiálise. A diabetes e a hipertensão, doenças comuns em idosos, são fatores de risco para a doença renal crônica. Segundo a professora Sônia Soares, o Ministério da Saúde criou programas de prevenção, mas ainda há lacunas em suas execuções.
"Como não há vagas para todos, é importante detectarmos a doença em fase inicial”
“O crescimento das taxas de longevidade do brasileiro também favorece a ampliação do número de casos da doença renal crônica. Estimativas indicam aumento de 8% de novos casos de doença com necessidade de tratamento dialítico ou transplante renal. Como não há vagas para todos, é importante detectarmos a doença em fase inicial”, recomenda a professora.
Patrícia Barbosa acrescenta que parcerias com a Secretaria Municipal de Saúde foram estabelecidas para encaminhar idosos em estágios 3, 4 ou 5 ao nefrologista, mas a fila de espera por consulta à especialidade é extensa. “Tínhamos 48 idosos para encaminhar, mas, como a lista de espera é grande, a lesão renal vai se agravando. Assim, perdemos as chances de intervir na progressão da doença, e uma das pacientes do projeto precisou de hemodiálise de urgência”, conta.
Para a saúde entrar
A constatação de que a consciência da doença renal crônica é pouco difundida na população e até entre profissionais de saúde resultou no projeto de extensão DRC: de portas abertas para a Srª Saúde entrar. Por meio dele, pesquisadores da Escola de Enfermagem elaboraram materiais lúdicos-pedagógicos e interativos para que os idosos recebam orientações sobre fatores de risco para o desenvolvimento da doença renal crônica, diabetes mellitus e hipertensão arterial.
"A inserção do pesquisador no domicílio abre espaço para novos olhares, possibilitando a intervenção”
“Ensinamos às pessoas como proteger os rins. Além disso, pacientes diagnosticados com grau mais avançado da doença também são orientados a procurar uma unidade de saúde para que sejam encaminhados ao nefrologista”, afirma Patrícia Barbosa. A pesquisadora destaca, ainda, o ineditismo do trabalho. “Não conhecemos outro estudo com base populacional no Brasil que faça o rastreamento precoce da doença renal crônica em idosos. A inserção do pesquisador no domicílio abre espaço para novos olhares, possibilitando a intervenção”, diz ela, acrescentando que o objetivo do projeto é detectar outros problemas relacionados à doença renal crônica.