Pesquisa e Inovação

‘Transferência de tecnologia é o grande desafio das universidades’, diz reitora da UFMG

Em evento na Capes, Sandra Goulart apresentou ações que a Universidade desenvolve, à luz de sua política de inovação, para se conectar com o setor empresarial

Mercedes Bustamante, Denise de Carvalho, o moderador da mesa, Charles Morphy, e a reitora Sandra Regina Goulart Almeida
Mercedes Bustamante, Denise de Carvalho, Charles Morphy e a reitora Sandra Goulart Almeida Foto: Captura de tela

A importância da atuação sinérgica entre universidades, centros de pesquisa, governo e empresas foi defendida pelos gestores que participaram do painel A pós-graduação e os ecossistemas de inovação, realizada na manhã desta quarta-feira, 31, como parte da reunião preparatória para a 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI), que ocorrerá em junho, em Brasília.

Na atividade de abertura do evento organizado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), a presidente do órgão, Mercedes Bustamante, a secretária de Educação Superior do MEC, Denise de Carvalho, o presidente da Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG), Vinícius Soares, e a reitora da UFMG, Sandra Regina Goulart Almeida, destacaram o papel da pós-graduação stricto sensu brasileira para a inovação tecnológica no país.

Sandra Goulart apresentou dados da UFMG que mostram como a Universidade busca essa aproximação com o mercado e com a inovação. Segundo a reitora, a questão legal precisa ser considerada, uma vez que "poucas universidades conhecem o Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação. Praticar e aprender como se dão as negociações no âmbito da tecnologia é importante para que as universidades se aproximem das empresas".  

Sandra Goulart destacou potencial das spin-off acadêmicas
Sandra Goulart destacou potencial das spin-off acadêmicas Foto: Reprodução de tela

A legislação citada pela reitora foi elaborada para promover as atividades científicas e tecnológicas como estratégicas para o desenvolvimento econômico e social do país, além de estabelecer diretrizes para a cooperação e interação entre os entes públicos e as empresas. 

No caso específico da UFMG, Sandra Goulart detalhou como se deu a elaboração e a aprovação da Política de Inovação da Universidade. Tal política vai ao encontro do processo contínuo das ações da UFMG para conectar sua produção científica ao setor produtivo, oferecer suporte aos pesquisadores na gestão de ações empreendedoras e proteger a produção científica por meio de ativos de propriedade intelectual e licenciamento de tecnologias.

"A transferência de tecnologia é o grande desafio das universidades, que precisam se aproximar do setor empresarial. No caso específico da UFMG, a elaboração da nossa Política de Inovação foi essencial para que conseguíssemos fazer essa ponte com o mercado. Essa cooperação é importante e se dá, também, por meio de alianças estratégicas, acordos e parcerias de pesquisa e desenvolvimento. Precisamos desconstruir o mito de que a academia fica reclusa em uma torre de marfim, afastada da sociedade e das empresas."

Outro exemplo citado pela dirigente da UFMG são as spin-offs acadêmicas, empresas criadas para viabilizar um negócio como resultado de pesquisas ou conhecimentos desenvolvidos nas universidades. "As spin-offs empregam mais egressos da pós-graduação que os empregadores comuns. Hoje, 5% dos ativos de propriedade intelectual da UFMG são transferidos para spin-offs, então elas também precisam ser vistas como um meio de integração", defendeu.

 

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Mercedes: pós ainda é fator de empregabilidadeFoto: Captura de tela

Mercedes Bustamante iniciou sua fala lembrando a evolução brasileira na pesquisa e na inovação. A presidente da Capes mostrou que o país cresceu 798% no volume de artigos publicados e 21% no impacto de citações, o que o coloca na 47ª posição mundial em termos de visibilidade acadêmica. "Em 2022, tínhamos a 14ª maior produção científica do mundo. Se na década de 1970 nossos programas de pós-graduação estavam presentes em apenas 23 municípios brasileiros, hoje estão distribuídos em 324 municípios. Essa expansão dos programas e, consequentemente, da pesquisa acadêmica nacional nos ajudou a melhorar nossa posição no cenário mundial."

A diretora da Capes explicou que o Plano Nacional de Pós-graduação (PNPG) 2021-2030, documento que define as diretrizes, estratégias e metas para a política do segmento no Brasil, precisa levar em conta as desigualdades regionais, além de estimular a ampliação do acesso e a permanência dos estudantes  nos programas.

"A pós-graduação ainda é um importante fator de empregabilidade. Por isso, precisa ser planejada com foco na assimetria do seu desenvolvimento, ou seja, precisamos buscar mais equidade na distribuição dos programas em todo o território nacional. Além disso, é preciso levar em conta a interação com a educação básica, a internacionalização e a pesquisa em conjunto com a extensão e com a inovação", asseverou. 

Evolução dos programas de pós-graduação no território brasileiro
Evolução dos programas de pós-graduação no território brasileiro Imagem: Reprodução

Uma porta de entrada, várias de saída
Ao ingressarem na pós-graduação, muitos estudantes vislumbram a carreira acadêmica de professor universitário como única alternativa possível, o que acaba afastando a mão de obra qualificada e egressa dos programas stricto-sensu das empresas.

"Hoje, a única perspectiva para o pós-graduando é tornar-se professor depois que se forma. Isso ocorre porque a nossa pós ainda é muito engessada e não contempla a perspectiva do mercado. Precisamos aproximar a pós-graduação das empresas por meio de políticas que incentivem a indústria a contratar os mestres e doutores egressos das nossas universidades", defendeu o presidente da Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG), Vinícius Soares.

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Denise: necessidade de ampliar as 'portas de saída da pós'Foto: Captura de tela

A secretária de Educação Superior do MEC, Denise de Carvalho, acrescentou que a existência de apenas "uma porta de saída" para os egressos dos cursos de pós-graduação acaba gerando uma fuga de cérebros, visto que os pesquisadores encontram melhores oportunidades de trabalho no exterior. "Estamos exportando cérebro e conhecimento, mas não alta tecnologia. As universidades públicas produzem mais de 90% do conhecimento nacional, mas é importante que esse conhecimento engaje com as necessidades sociais e com as demandas do mercado, sempre levando em conta o contexto socioeconômico do país", disse.

Bônus demográfico
Para elaborar as políticas públicas de tecnologia e inovação, o país também precisa levar em conta o perfil demográfico de sua população, defendeu Mercedes Bustamante em sua participação no painel. O último censo do IBGE, divulgado no fim do ano passado, mostrou que o Brasil se aproxima do chamado "bônus demográfico", que ocorre quando um país reúne, proporcionalmente, um maior número de pessoas em idade ativa para trabalhar. Para os demógrafos, trata-se do momento ideal para que o país evolua, se desenvolva e cresça economicamente.

"Quando passarmos desse bônus, teremos mais crianças e idosos, segmentos da população que não trabalha. Precisamos nos inspirar no Japão, que já passou por essa transição demográfica. Como a nossa força de trabalho vai diminuir nos próximos anos, devemos agir com consciência, usando essa mão de obra qualificada para a pesquisa e para o desenvolvimento de ciência e inovação tecnológica e social", concluiu a presidente.

A conferência
Com o tema Ciência, tecnologia e inovação para um Brasil justo, sustentável e desenvolvido, a 5ª CNCTI tem o objetivo de propor recomendações para a elaboração da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI) 2024-2030. As reuniões temáticas e os painéis são espaços de diálogo com especialistas que contribuem para identificar o atual cenário e definir recomendações e propostas para discussões durante a conferência, que ocorrerá de 4 a 6 junho, em Brasília.

Luana Macieira