UFMG participa de pesquisa em busca de vacina contra a covid-19
Coordenada em todo o país pelo Instituto Butantan, iniciativa testa composto desenvolvido por laboratório chinês
Nesta sexta-feira, 31 de julho, profissionais de saúde de Belo Horizonte foram os primeiros voluntários submetidos a um teste que busca avaliar a eficácia da CoronaVac, candidata à vacina contra a covid-19. Dez pessoas participaram dos primeiros testes. Ao todo, 852 belo-horizontinos serão testadas no ensaio, que é resultado de parceria entre a UFMG e o Instituto Butantan, de São Paulo. O professor Mauro Martins Teixeira, do Departamento de Bioquímica e Imunologia do ICB, responsável pelas pesquisas em Minas Gerais, concedeu entrevista coletiva sobre o ensaio, na tarde de hoje, e esclareceu o processo de realização do estudo.
A UFMG é o único centro de pesquisa de Minas Gerais a realizar os testes, que também começaram nesta semana em todo o Brasil. O Instituto Butantan é responsável pela coordenação da pesquisa no país. O objetivo é testar a eficácia de uma candidata a vacina desenvolvida na China pela biofarmacêutica Sinovac Biotech.
“O preceito básico do estudo clínico é que há evidências de que o benefício seja muito superior a qualquer malefício da candidata vacinal”, destacou o professor durante a coletiva realizada virtualmente. "A candidata vacinal foi produzida com base no vírus inativado, que foi submetido a esse processo [de inativação] duas vezes. Essa é uma precaução importante", destacou Mauro Teixeira. A aplicação dos testes foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).
O estudo clínico visa avaliar a eficácia do produto contra o vírus, com a aplicação da CoronaVac e de placebo em grupo de profissionais da saúde que trabalham no atendimento direto aos pacientes acometidos pela covid-19.
Apenas na equipe de Minas Gerais, são cerca de 30 profissionais e pesquisadores empenhados no estudo, entre médicos, enfermeiros, farmacêuticos e laboratoristas. De acordo com Mauro Teixeira, a previsão é de que o acompanhamento dos voluntários seja feito durante 12 meses, a começar da aplicação da vacina no último participante. Esse prazo, no entanto, pode ser reduzido caso os resultados sejam positivos.
Em entrevista à TV UFMG, na manhã desta sexta-feira, o professor Mauro Teixeira explicou as etapas do ensaio clínico e falou sobre as características da candidata vacinal e das expectativas sobre ela.
Ficha técnica: Renata Valentim (produção e edição de conteúdo), Olívia Resende (reportagem), Lucas Tunes (imagens) e Otávio Zonatto (edição de imagens).
Como funciona o teste
Os voluntários receberão duas doses, num intervalo de 15 dias, da CoronaVac ou do placebo. O estudo é chamado "duplo cego", o que significa que nem os pesquisadores nem os voluntários saberão quem recebe a candidata vacinal ou o placebo. O professor explica que 15 dias é o tempo mínimo necessário para que o sistema imune se acostume com a primeira dose e possa receber a segunda com a expectativa de aumento de imunidade após sua aplicação.
Apenas na equipe de Minas Gerais, são cerca de 30 profissionais e pesquisadores empenhados no estudo, entre médicos, enfermeiros, farmacêuticos e laboratoristas.
Normalmente, o intervalo entre a aplicação das duas doses é de um mês, mas esse prazo foi ajustado para acelerar os resultados em período de urgência pandêmica. “Até chegar aqui, essa possível vacina passou por várias etapas de ensaios clínicos. Isso tem sido feito no que chamo de velocidade pandêmica, mas todo ensaio clínico visa à segurança. Como em todo e qualquer estudo com seres humanos, queremos segurança e eficácia”, ressaltou Mauro Teixeira.
Esta é a terceira fase de testes da pesquisa. Os voluntários serão acompanhados detalhadamente, por meio de preenchimento de um diário indicando possíveis reações, coleta de dados e exames individuais prévios. “É mais importante acompanhar do que vacinar. Esse acompanhamento durante um ano vai definir se essa vacina é eficaz ou não”, expôs o pesquisador.
A velocidade dos resultados depende do controle de eficácia alcançado entre o número de voluntários vacinados e o número de casos de covid-19 neste grupo. “Se tiver febre ou algum sintoma típico da doença, a pessoa vai nos procurar. Isso é o que chamamos de desfecho”, explicou o pesquisador. Os mais de 800 voluntários recebem a aplicação da candidata vacinal nas próximas seis a oito semanas.
Participação da UFMG no estudo só é possível em razão do seu histórico de relevância para a ciência nacional e de sua infraestrutura, resultado de investimentos realizados anteriormente.
Produção nacional
Se atestada a eficácia do produto, a proposta é que a vacina seja fabricada pelo Instituto Butantan, que, de acordo com o professor, já investe tempo e recursos em busca de uma produção significativa para sua rápida distribuição no país. “Há uma grande operação não só por trás do ensaio clínico, mas também de produção para que, uma vez que tenha eficácia comprovada, o produto seja distribuído da forma melhor e mais rápida possível”, reforçou.
O professor afirma que a velocidade no desenvolvimento dos estudos não representa a mudança de protocolos, mas um grande investimento para apresentar solução para um importante desafio global. “Foram mais de 90 mil brasileiros mortos em seis meses por causa de uma doença. Isso é claramente preocupante”, registrou. “Há muita preocupação com a segurança. Não acho que haverá mudança de protocolos, mas estamos aprendendo a lidar com desafios que demandam uma rapidez absurda em lidar com um problema que é mundial”, completou.
Ciência e investimento
Durante a coletiva de imprensa, o professor defendeu a importância de investimento de longo prazo em ciência e tecnologia, destacando o importante papel que as universidades públicas desempenham na busca de soluções para o impacto da pandemia no país.
“Para participar de um processo como esse, precisamos estar prontos. E esta é uma briga muito grande dos cientistas: só conseguimos fazer ciência de qualidade se há infraestrutura de qualidade”, defendeu Mauro Teixeira. Ele destacou que a participação da UFMG no estudo só é possível em razão do seu histórico de relevância para a ciência nacional e de sua infraestrutura, resultado de investimentos realizados anteriormente.
“As pessoas reconhecem nossa competência na área, o papel da UFMG e do Instituto de Ciências Biológicas. Nossos pesquisadores têm responsabilidade local e internacional. Por isso, é importante investir nesse trabalho”, enfatizou o professor.