Pesquisa e Inovação

Disparidade na expectativa de vida em BH é menor que em capitais da América Latina

Capital mineira também tem menor diferença entre expectativa de vida de homens e mulheres quando comparada a cidades de outros países

Vista de Belo Horizonte
Belo Horizonte: disparidade é menor que em outras cidadesCarol Morena / Medicina UFMG 

Estudo inédito identificou relevantes desigualdades na expectativa de vida de seis grandes cidades latino-americanas: Buenos Aires, Belo Horizonte, Santiago, San José, Cidade do México e Cidade do Panamá. A variação da expectativa de vida ocorre tanto na comparação entre as cidades analisadas quanto dentro de cada uma dessas regiões. De acordo com o projeto Saúde Urbana na América Latina (Salurbal), que conta com pesquisadora da Faculdade de Medicina da UFMG, essas diferenças são determinadas pelo nível socioeconômico. Os dados foram publicados em artigo na The Lancet Planetary Health, no dia 10 de dezembro.

Na avaliação sobre Belo Horizonte (BH), considerando 21 cidades pertencentes à região metropolitana, verificou-se que a capital tem uma expectativa de vida mais alta do que os outros municípios próximos, assim como a média de escolaridade. De acordo com a professora Waleska Caiaffa, do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina, coordenadora do ramo Brasil no Salurbal, há lugares onde a expectativa de vida pode aumentar em sete e oito anos, para mulheres e homens, respectivamente.

Gráfico demonstra as faixas de expectativa de vida distribuídas pelas regionais de Belo Horizonte
Gráfico demonstra as faixas de expectativa de vida distribuídas pelas regionais de Belo Horizonte Salurbal

Para Waleska, a heterogeneidade entre as subáreas avaliadas revela desigualdades importantes que comprometem a qualidade de vida da população, ainda que não sejam tão destoantes como em Santiago, no Chile, e na Cidade do Panamá, por exemplo. Em Santiago, a diferença na expectativa de vida entre as subáreas para os homens é de quase nove anos e chega a 18 anos para as mulheres. Já a Cidade do Panamá apresenta diferença de quase 15 anos na expectativa de vida para homens e mulheres.

O estudo mostra o nível médio de educação em cada região da área urbana como determinante para a expectativa de vida de seus moradores. No caso de Belo Horizonte, viver em uma área com maior nível de escolaridade pode implicar expectativa de vida quase cinco anos maior.

Gráficos ilustram a relação entre expectativa de vida e escolaridade de mulheres e homens em Belo Horizonte
Gráficos ilustram a relação entre expectativa de vida e escolaridade de mulheres e homens em Belo Horizonte Salurbal

Mas, apesar desse hiato, segundo a professora, “em relação às outras metrópoles do estudo, Belo Horizonte está bem situada, porque a disparidade entre a expectativa de vida do homem e da mulher (média de cinco anos) é menor do que outras analisadas”. Apenas em San José, capital da Costa Rica, a diferença é menor (média de três anos). “Isso é interessante. Apesar de muitos problemas, ainda somos uma região boa para se viver na comparação com as outras cidades latino-americanas contempladas no estudo”, avalia.

Waleska revela que, em todos os resultados encontrados, as mulheres vivem mais do que os homens, e são preocupantes as disparidades, na Cidade do Panamá (diferença média de 16 anos na expectativa de vida entre homens e mulheres), em Santiago do Chile (diferença de 11 anos) e na Cidade do México (diferença de nove anos).

“Isso significa que os homens estão morrendo muito mais cedo, e esse é um sério problema demográfico. Ao inverter a pirâmide etária, temos disparidade de proporção entre mulheres e homens. Sem contar que, em muitas famílias, só eles trabalham, e essas mortes precoces comprometem a renda da família”, comenta a professora da Faculdade de Medicina.

Escolaridade marca qualidade de vida
Os pesquisadores avaliaram a relação da expectativa de vida com a questão socioeconômica, usando a educação como marcador. Para isso, foi considerado o nível adequado de escolaridade aos 25 anos – quantos anos de estudo as pessoas tiveram até essa idade em uma média da região analisada. “Sabe-se que as pessoas estão vivendo mais, então esse é um trabalho importante para avaliar a relação com as desigualdades injustas: pessoas com maior acesso à educação e melhores condições econômicas têm maior expectativa de vida do que aquelas com menor acesso ou poder aquisitivo”, afirma Waleska Caiaffa.

“Esta é a primeira vez que se mapeia a magnitude extrema das desigualdades chamadas de injustas, ou iniquidades, na expectativa de vida em várias áreas urbanas de grandes cidades da América Latina, o que constitui um primeiro passo fundamental para reduzi-las ou erradicá-las no futuro”, diz Usama Bilal, professor da Universidade de Drexel, na Filadélfia (EUA), e primeiro autor do estudo.

Waleska Caiaffa ressalta que muitos artigos avaliam a questão da mortalidade, medindo, por exemplo, o risco de morte de determinada população. Mas a expectativa de vida reflete melhor a qualidade de vida, já que diz respeito aos anos desde o nascimento até a idade mais longeva possível.

“Esse é o primeiro estudo que possibilita comparar a expectativa de vida de seis importantes regiões urbanas da América Latina, bem como verificar as disparidades dentro de cada uma e começar a investigar o quanto podem ser modificadas”, destaca a professora. “Do ponto de vista da saúde, já se trabalha com uma série de questões, agora é preciso também pensar no território em que essas pessoas vivem, como vivem, se se deslocam, qual é o tipo de lazer, a alimentação e todas as possibilidades do cotidiano”, completa.

De acordo com a professora, a partir desse estudo, “deve-se pensar nas políticas públicas, olhando não só para o que a saúde pode fazer, mas também para a qualidade de vida dessas pessoas na cidade”.

“Esses resultados destacam a importância do desenvolvimento de políticas urbanas focadas na redução das desigualdades sociais e na melhoria das condições socioambientais nos bairros mais pobres das cidades latino-americanas”, acrescenta Ana Diez Roux, pesquisadora do Salurbal e coautora do estudo.

Salurbal
O Saúde Urbana na América Latina (Salurbal) é um projeto de pesquisa sobre como as políticas e o ambiente urbano afetam a saúde dos moradores das cidades latino-americanas. Os resultados desse projeto, inanciado pela Wellcome Trust, servirão de referência para informar futuras políticas e intervenções capazes de tornar as cidades mais saudáveis, mais equitativas e sustentáveis em todo o mundo.

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Deborah Castro / Faculdade de Medicina da UFMG