Pesquisa e Inovação

Grupo da Química desenvolve tecnologia que transforma óleos descartáveis em combustíveis sustentáveis

Catalisador gera produto que neutraliza a emissão de gases causadores do efeito estufa

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Catalisador no formato de pó e adaptado para a forma de esferas, o que possibilita o uso na planta-piloto em condições próximas às industriais
Foto: Jebs Lima | UFMG

O elevado consumo da gasolina e de outros combustíveis fósseis é um problema global e está diretamente relacionado à alta emissão de gases causadores do efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO2). Para mitigar esse efeito, pesquisadores do mundo todo buscam novas tecnologias para a produção de combustíveis sustentáveis, que são aqueles de fontes renováveis, como a biomassa. 

Uma alternativa aos combustíveis fósseis foi desenvolvida no Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas (Icex) da UFMG. Trata-se de um catalisador que possibilita que óleo de frituras e de soja, macaúba, mamona, castanha de caju e até sebo de boi sejam transformados em biogasolina, em diesel verde e em combustível sustentável de aviação (SAF).

A pesquisa está sendo desenvolvida no Laboratório de Ensaios de Combustíveis (LEC), no âmbito do doutorado do pesquisador Yuri Gontijo Rosa, orientado pela professora Vânya Pasa e coorientado pelo pesquisador visitante Henrique Oliveira. Gontijo desenvolveu um catalisador que possibilita que, sob condições ideais de temperatura e pressão, os óleos descartáveis sejam convertidos  em combustíveis sustentáveis.

Yuri e o co-rientador Henrique
O doutorando Yuri e o coorientador Henrique: produto desenvolvido na UFMG é estável, eficiente e tem alta taxa de conversão
Foto: Jebs Lima | UFMG

“O estudo teve início no meu mestrado, quando comecei a desenvolver o catalisador, uma espécie de pó com propriedades específicas. Esse catalisador é composto de elementos químicos que promovem uma mudança na estrutura das substâncias colocadas com ele, no caso, os óleos. O catalisador provoca a reação responsável pela geração do combustível sustentável”, explica Yuri.

A professora Vanya acrescenta que já existem outros catalisadores que possibilitam reações químicas semelhantes, mas o produto desenvolvido no LEC tem vantagens. “Ele é muito estável, eficiente e tem uma taxa de conversão alta, além de ser muito versátil, o que possibilita que seja usado com diversos tipos de biomassa, como sebo, gordura, óleo de fritura e gordura de porco, entre outros”, diz.

A patente da tecnologia foi depositada neste ano no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). A equipe do LEC agora produz o catalisador na forma granulada e prototípica para testá-lo em escala-piloto que utilizará, como matéria-prima para o biocombustível, cerca de 10 quilos de biomassa por dia. Para Vanya Pasa, esse tipo de estudo é essencial para a sociedade, pois “vai ao encontro das metas definidas em consenso por todos os países no Acordo de Paris, visando à descarbonização do setor de aviação, o que contribui para a proteção do meio ambiente”, diz ela.

À esquerda, o biocombustível produzido no LEC; à direita, o óleo residual de fritura
À esquerda, o biocombustível produzido no LEC; à direita, o óleo residual de fritura Foto: Jebs Lima | UFMG

Combustíveis avançados
Yuri explica que existem vários tipos de combustíveis sustentáveis, também chamados de combustíveis avançados: drop-in, renováveis, diesel verde e SAF. Todos eles são análogos a combustíveis fósseis, que não evitam os danos ao meio ambiente. 

“Eles são similares aos combustíveis fósseis, têm as mesmas substâncias e propriedades físico-químicas, mudando apenas a origem de fontes renováveis. Os combustíveis avançados minimizam a emissão dos gases do efeito estufa porque vêm de fontes renováveis”, ressalta.

O combustível sustentável da aviação (SAF) já é utilizado em alguns países da Europa e da América do Norte. Ele reduz a emissão de CO2 entre 70% e 90% em comparação ao querosene de aviação. O biocombustível, por sua vez, é resultante da biomassa, ou seja, de qualquer material de origem orgânica, como a cana-de-açúcar, a mamona, a soja, a mandioca e seus óleos. O Brasil tem em seu mercado o biodiesel, que é produzido com base em óleos e gorduras e que pode ser misturado ao diesel. 

Amostra de óleos e combustíveis do LEC
Amostras de óleos e combustíveis do LEC Foto: Jebs Lima | UFMG

Vanya Pasa explica por que os combustíveis sustentáveis produzidos por meio do catalisador desenvolvido no LEC são superiores ao biodiesel comercializado no país. “O biodiesel oxida, ou seja, absorve água, e isso gera microrganismos e decomposição. O diesel verde e o bioquerosene que produzimos com o catalisador não têm oxigênio e, por isso, naturalmente, não oxidam. Dessa forma, esses combustíveis não degradam os motores. Uma máquina agrícola, por exemplo, pode estragar se ficar parada por muito tempo com biodiesel. Com o diesel verde isso não acontece", relata.

A professora acrescenta que o catalisador vai baratear a produção de combustíveis sustentáveis, que hoje é mais cara que a de combustíveis fósseis. Porém, ainda há desafios a enfrentar para uma produção robusta. “O Brasil precisa desenvolver políticas públicas que favoreçam a coleta do óleo de fritura, do sebo do boi e dos demais elementos que seriam descartados e que podem tornar-se matéria-prima – biomassa – para a produção do combustível sustentável. A intenção é que, no futuro, não apenas aviões e máquinas agrícolas, mas outros veículos possam utilizá-lo”, projeta a coordenadora do LEC.

A tecnologia também é abordada em reportagem da TV UFMG. Assista ao vídeo.

Luana Macieira