Hospital Veterinário implanta projeto para reduzir infecção hospitalar
Guia orienta profissionais para aprimorar o manejo de antibióticos e indica medidas para minimizar riscos aos animais internados
A infecção por bactérias resistentes será um dos grandes desafios da humanidade nos próximos anos, indica a Organização Mundial de Saúde (OMS). A instituição prevê que, em 2050, serão registradas 10 milhões de mortes em consequência de infecções causadas por bactérias resistentes a antibióticos. Como 72% de todo o antibiótico usado no mundo tem aplicação veterinária, esse campo da medicina acaba contribuindo mais para a seleção de bactérias resistentes.
A Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Veterinário da UFMG, instituída em outubro do ano passado, criou um guia para promover a redução dos casos de infecção que ocorrem no âmbito do hospital. O manual traz informações sobre diversos tipos de infecção e foi criado em conjunto com um sistema de notificação de infecções hospitalares e de microrganismos resistentes.
“Se o veterinário em atuação no hospital identifica que há um quadro de microrganismos resistentes em um animal, ele notifica a comissão para observar o caso com mais cuidado e implementa medidas de controle, como o isolamento do animal. Dessa maneira, conseguimos reduzir as chances de disseminação dos patógenos”, explica o professor Rodrigo Otávio Silveira Silva, do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da Escola de Veterinária da UFMG.
Rodrigo Silveira, que é membro da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, acrescenta que o grupo percebeu que havia problemas relacionados à falta de padronização para a prescrição de antibióticos pelos médicos veterinários. Assim, a primeira etapa dos trabalhos normatizou e regulamentou o uso dos antibióticos no hospital. Para isso, a equipe de profissionais da Comissão, formada por médicos veterinários, enfermeiros, farmacêuticos, pesquisadores e professores, pesquisou a literatura especializada, guias internacionais e outros trabalhos científicos para identificar o medicamento mais recomendado para cada tipo de infecção.
“Foi assim que montamos um guia de antimicrobianos para o hospital. Agora os médicos têm um material de consulta que apoia a escolha do que é indicado para cada infecção. Fizemos um trabalho cuidadoso na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do hospital e, ao longo dos últimos três anos, publicamos diversos artigos sobre as infecções registradas. Todo esse trabalho meticuloso culminou no nosso guia”, diz Rodrigo Otávio.
Só limpeza não é suficiente
Infecção hospitalar é aquela adquirida após a admissão do paciente na unidade, mas pode se manifestar posteriormente, durante a internação do animal ou depois que ele recebe alta hospitalar.
Rodrigo Otávio explica que as pessoas tendem a achar que a causa da infecção hospitalar está restrita à infecção do ambiente, ou seja, a uma mesa suja ou a um chão contaminado. Porém, esse fenômeno tem ligação forte com o uso inadequado de antimicrobianos. “Quando utilizamos os antibióticos de forma incorreta, a chance de excreção de patógenos no ambiente e de seleção de patógenos resistentes é grande. Nesses casos, mesmo que seja feita uma boa limpeza ambiental, ainda há chance de infecção, pois alguns antimicrobianos aumentam a excreção dos patógenos."
Se desinfetar o ambiente não é o bastante para evitar as infecções, é necessário reduzir o uso dos antibióticos que aumentam a excreção dos patógenos, mitigando, assim, o principal mecanismo de infecção hospitalar. “Temos que associar as medidas de racionalização e controle do uso de antimicrobianos às de desinfecção ambiental e de conscientização de higiene, relacionadas, por exemplo, à maneira correta e à frequência da lavagem das mãos pelos profissionais, ao uso adequado de luvas e à restrição de acesso aos animais com infecção”, explica o professor da Escola de Veterinária.
O material produzido pela Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Veterinário pode ser consultado por todos os profissionais que atuam no hospital, servindo de referência também para o aprendizado dos médicos veterinários recém-formados que fazem estágio ou residência médica.
O guia é multidisciplinar e, apesar de normatizar condutas, oferece uma margem de liberdade de atuação para o médico veterinário. O próximo passo da comissão é investigar o uso dos antibióticos dentro do hospital.
“O guia é um ganho para o hospital porque nos ajuda a entender como a infecção acontece. Como também há farmacêuticos na equipe e no hospital, conseguimos monitorar a quantidade de cada antibiótico usada todos os meses. Assim, podemos saber quais são os antibióticos que mais contribuem para fortalecer as bactérias e se a aplicação das orientações do guia ajudou a reduzir o uso desses medicamentos”, diz Rodrigo.
Mais segurança para os donos de pets
A iniciativa da formulação de um guia para reduzir a incidência de infecções em um hospital veterinário por meio da normatização do uso de antibióticos é inovadora no país. Além de gerar estudos futuros, sua implementação aumenta a segurança dos pacientes que passam pelo Hospital Veterinário da UFMG.
“Muitas pessoas temem falar de infecção hospitalar, como se isso diminuísse a qualidade do hospital. Mas é jogando luz no problema que conseguiremos agir. A comissão e o guia normatizam e criam regras para um assunto importante, que é identificar onde e como ocorre a infecção e seus níveis quantitativos. Só assim é possível reduzir os casos e dar segurança às pessoas que deixam seus animais naquele ambiente”, conclui o professor.